Benfica v Celtic: ir a Las Vegas e perder

Submetida por Phant em

Quando o Celtic apenas superou a ambição benfiquista através de moeda ao ar e Diamantino Costa resistiu até ao fim do jogo com um braço partido. Não perca, esta terça-feira a partir das 19:45, o decisivo Benfica vs Celtic em mais uma jornada da fase de grupos da Liga dos Campeões.

 

 

 


Nenhuma das equipas atravessava um grande momento naquele início de Novembro (ambas vinham de derrota nos respectivos campeonatos), mas a categoria de Benfica e Celtic era inegável. Ambos já tinham chegado ao topo da fama com vitórias na Taça dos Campeões – duas vezes o Benfica, uma o Celtic –, e só isso bastava para justificar o entusiasmo que percorria a Europa e fazia inúmeros observadores de outros clubes europeus marcar presença em Park Head.


Coluna, que saíra tocado na partida do campeonato, constituía a grande preocupação de Otto Glória e seria dúvida até à hora do jogo, com Jaime Graça e José Augusto a espreitar a titularidade. Entretanto, também no Celtic o lendário Jock Stein não podia contar com o lesionado Bobby Lerox, mas regozijava-se com o regresso de Tommy Gemmel (e que regresso!) e Willie Wallace. O jogo, esse, correu sempre de feição aos escoceses e logo no primeiro minuto Gemmel – lá está – fez o primeiro da partida num soberbo remate de força e colocação. O golo madrugador como que deu asas à equipa do Celtic e a louca euforia que envolveu o estádio naqueles primeiros minutos só seria travada pela agilidade e valentia de José Henrique na baliza encarnada. Eusébio, que apenas jogou a primeira parte por se ter magoado, ainda alarmou os 80000 escoceses presentes ao aproximar-se várias vezes com perigo da baliza de Fallon, mas falhou precisamente no seu ponto mais forte: o remate. No regresso para a segunda parte, e mesmo sofrendo o segundo golo em cima do intervalo, o Benfica não se deixou abater e manteve o seu futebol suave e harmonioso da primeira metade. Simões deu sempre o exemplo com jogadas magistrais, mas seria com o Benfica ao ataque que o Celtic faria o terceiro golo, por Hood, num cabeceamento imparável. Os encarnados tinham mostrado a sua categoria, mas haviam caído perante a eficácia escocesa e a sua própria ineficácia. A desvantagem parecia insuperável, mas uma sólida esperança, saber-se-ia depois, estava guardada para dali a quinze dias em Lisboa.


No Estádio da Luz, o que parecia impossível aconteceu mesmo: o Benfica, golo por golo, anulou a pesada desvantagem trazida de Glasgow. Inesperadamente, porque o adversário era o famoso Celtic de Jock Stein e, mais inesperadamente ainda, porque o azar tinha batido à porta do campeão português, impedindo-o de fazer alinhar elementos da influência de Humberto Coelho e Torres. Mais que isso: Eusébio, doente e ainda condicionado pelo «toque» do primeiro jogo, estava em dúvida e implorava a todos os santinhos (leia-se Otto Glória) que o deixassem jogar; seria no meio de toda esta «confusão» que o Benfica iria igualar o 0-3 da primeira partida. Não se pense, porém, que o jogo foi fácil. Pese embora todo o assalto encarnado à baliza adversária, o Celtic esteve de tal modo perto de destruir as ilusões benfiquistas que José Henrique foi uma das figuras da partida. Pode mesmo dizer-se que foi pela categoria do guarda-redes benfiquista que aquilo que podia ter sido a consagração do futebol de contra-ataque dos escoceses acabou por não acontecer. Em vez disso, o que sucedeu foi algo realmente espantoso. O Benfica era «todo ataque» e carregava como nunca visto na direcção da baliza adversária. O desejado golo anunciava-se e, sem surpresa, apareceram dois no espaço de quatro minutos. O primeiro por Eusébio que, mesmo com febre, não desperdiçou um excelente passe de Simões; o segundo, logo a seguir, por Jaime Graça em conclusão de uma bela jogada também ela iniciada pelo irrequieto Simões. O intervalo chegaria com 2-0 no marcador e no início da segunda parte começariam a surgir os primeiros sinais de fadiga nas hostes encarnadas. O Benfica seguia inconformado, e já com o jovem Vítor Martins no lugar de Eusébio, tentava o terceiro golo mas a barreira de camisolas listadas a verde ia parando a maioria dos golpes encarnados e tentava até lançar os seus. E quando parecia que afinal não seria possível, que a vantagem não seria anulada, mesmo ao soar do gongo, eis que um livre de Simões permite a Diamantino Costa o anular da vantagem escocesa. Três-a-zero e seguia-se o prolongamento.


Na meia hora complementar, o Benfica continuou a buscar o quarto golo que lhe daria a qualificação, mas a impressionante resistência e força encarnada, que foi mesmo além dos limites pois Diamantino Costa manteve-se na luta até ao fim com… um braço partido, não foi suficiente. Podia ter sido, mas não foi. O jogo terminou como estava e na altura não havia cá desempate por penaltis; o resultado de todo o esforço, de toda a abnegação benfiquista, estava agora concentrado numa moeda de um florim saída do bolso do árbitro holandês que apitara o jogo. Isso mesmo, o vencedor da eliminatória seria decidido por… moeda ao ar. Os dois capitães dirigiram-se às cabinas para o desempate. A moeda, essa, volteou no ar uma e duas vezes, e ao cair, o malfadado florim mostrou a sua vontade e disse que o Celtic é que era bom e merecia continuar na Taça dos Campeões. No estádio corria o rumor que o Benfica tinha vencido o desempate, mas o semblante de Coluna ao sair das cabinas dizia tudo: o Benfica tinha ido a Las Vegas e perdido; não apenas uma, mas duas vezes. O capitão do Celtic tinha ganho o primeiro lançamento que lhe conferia o direito de ser ele a lançar a moeda quando fosse a valer, e voltaria a ganhar o segundo, garantindo a passagem da sua equipa. Normalmente diz-se que é futebol, pode perder-se e pode ganhar-se, mas desta vez parece seguro dizer que não foi. Foi «apenas» sorte.