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Red Pass

Rumo ao 38

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Benfica 2 - 0 Gil Vicente: A Naturalidade Que Já Não Chega

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Há uma enorme diferença entre as expectativas dos profissionais e dos adeptos. Isto é, quem faz parte da organização do futebol profissional do Benfica, técnicos e dirigentes, não vê o pré jogo e o pós jogo da mesma maneira que os adeptos nas bancadas ou em frente à televisão. 

Uma das grandes mais valias que Bruno Lage trouxe ao universo do Benfica foi humanizar essa visão sobre o futebol em geral. Não se repete entre lugares comuns, não avalia os jogos segundo uma realidade paralela ou uma ciência obscura só ao alcance de uns iluminados e tenta sempre explicar as suas opiniões. 

Serve esta introdução para contextualizar os sentimentos mistos que ouvi e li após o jogo deste sábado à noite. 

É verdade que não se pode justificar uma exibição menos conseguida logo à partida com a paragem das datas FIFA. Mas não se deve ignorar quando o melhor jogador em campo, Adel Taarabt, diz que a tal paragem tornou este jogo mais difícil. 

Também não se deve justificar a menor intensidade de jogo do Benfica, principalmente depois do 2-0, com o facto de estarmos a poucos dias da estreia na Champions League. Mas na verdade é algo comum a quase todas as trinta e duas equipas que vão disputar a maior prova de clubes do mundo. É reparar nos resultados e exibições de Juventus, das equipas de Madrid, do Manchester City ou mesmo dos três adversários do Benfica, só o Zenit venceu e com bastantes dificuldades. 

Isto nem são desculpas, são factos para tentar chegar aquilo que quero. Penso que a melhor maneira de avaliar e analisar a exibição do Benfica é utilizar o pragmatismo e o equilíbrio contextualizando o momento competitivo do calendário.

Posto isto, recupero as diferenças entre profissionais e adeptos para ir directamente a um momento do jogo que me deixou confuso. Quando Jota está na linha lateral pronto para entrar começou uma corrente de desabafos nas bancadas. Aconteceu na minha bancada e acredito que tenha sido em todo estádio. "Pronto, ele vai tirar o RDT". 

Placas levantas e sai mesmo o espanhol. A reacção das bancadas veio nessa sequência, assobios para a repetida decisão de Bruno Lage. Algo que me pareceu lógico e natural numa relação aberta e honesta entre adeptos e treinador. Os adeptos não estão a gostar que saia sempre Raul de Tomas e manifestaram-se. Não vejo mal nenhum mesmo porque este é um estádio que tem um legado assustador nas bancadas onde adeptos assobiavam lendas como Nené ou Cardozo e a própria equipa a ganhar quando não goleava. Até aqui nada de anormal. 

Mas reparei que a reacção de Lage, RDT e Seferovic é que baralhou isto tudo porque todos interpretaram a assobiadela como se fosse para o jogador a sair. E não foi. Até foi uma manifestação de carinho e confiança no espanhol, os adeptos queriam mais tempo em campo. 

Esta á minha interpretação de um dos momentos mais acesos da noite. Posso estar enganado mas o protesto foi para a decisão da equipa técnica. Repito que não vejo mal nenhum nisso e acredito que Bruno Lage também não se importe de explicar a opção. Mas isto faz parte do futebol porque, como comecei por dizer, há sempre uma visão do banco e outra das bancadas. E assim é que tem de ser. 

Já agora, deixo aqui também a minha visão de adepto de bancada sobre a não entrada de Tomás Tavares. Se era para lançar o miúdo porque é que não se tratou da substituição mais cedo? Mais um exemplo da maneira diferente como se vive o mesmo jogo.

Por falar em jogo, o que mais interessava era garantir os três pontos. Estes são os jogos que precisam de ser resolvidos com convicção. Bruno Lage ao ter normalizado as goleadas do Benfica no campeonato corre sempre este risco quando vence "só" por 2-0. É uma pressão óptima, uma dádiva só ao alcance de poucos treinadores. Elevar a fasquia para ser cobrado por vitórias menos expressivas e empolgantes. Há treinadores que fazem toda uma carreira contentes com um triunfo por 1-0. Lage no Benfica tem que se justificar quando ganha por 2-0. 

Um jogo no Estádio da Luz contra uma equipa repescada da 3ª divisão, depois de uma goleada em Braga, depois de um último jogo na Luz de má memória, tudo isto somado pedia uma goleada com futebol atractivo num sábado à noite e motivação para o grande embate com o líder da Bundesliga que, diga-se, não está a entusiasmar os 60 mil que podem encher a Luz, o que lamento.

A realidade é que o Gil Vicente é uma equipa já bem arrumada, muito bem treinada por Vítor Oliveira, com alguns jogadores muito interessantes, como Kraev, Sandro Lima, Baraye ou o guarda redes Denis, e veio à Luz com um plano de jogo digno e bem pensado pelo seu treinador. 

Conseguiu atrapalhar os pontos fortes do Benfica, faltou mais qualidade ofensiva e assustar a defesa do Benfica mais vezes. Mas deixou boa imagem na visita à casa do campeão. 

No Benfica houve estreia na dupla do meio campo, Fejsa regressou à posição "6" e Taarabt voltou a ser "8" e, tal como em Braga, esteve muito bem. Tão bem que acabou por ser o melhor em campo tendo naquele passe que acabou por dar o 1-0 o melhor lance para recordar. 

De resto, a mesma equipa do Benfica com as qualidade de Pizzi e Rafa, as expectativas em Seferovic e RDT, os apoios de Grimaldo e André Almeida e a segurança de Ruben e Ferro. Odysseas voltou a assinar uma folha limpa, a quinta em seis jogos. 

Não foi exuberante, não foi entusiasmante mas é muito agradável que se passe a avaliar as exibições do Benfica do ponto de vista do luxo. É que foram décadas a analisar jogos do ponto vista do lixo onde algumas vitórias pela margem mínima eram elogiadas pelo esforço e triunfos por mais de um golo de diferença eram tranquilas. Eu gosto mais assim. Um 2-0 ao Gil Vicente que deixa o pessoal alarmado. É preciso mais e melhor. 

Volto a referir o conceito de equilíbrio, acho que é o mais sensato. Era preciso regressar ao ciclo de jogos de clube com uma vitória e sem sobressaltos. Depois de Pizzi ter falhado o penalti o jogo podia ter ficado feio. Felizmente, a equipa procurou o golo antes do intervalo. Até no feliz 1-0 há drama no Benfica, o autogolo de Ygor Nogueira deixou RDT em nervos. Ou seja, o Benfica resolvia um problema antes do intervalo mas como não foi de forma imaculada viu-se drama. Isto, às vezes, não parece um clube de futebol, parece um enredo do dramaturgo William Shakespeare. 

O Benfica ganhou bem, fez a sua parte antes de começar a caminhada europeia. Estamos com cinco jornadas na Liga e há dúvidas dentro do futebol do Benfica. Há e vai continuar a haver. Foi o primeiro jogo após o fecho de mercado e com as lesões vamos ter ser matéria para especular entre as posições "6" e "8" além das dinâmicas da dupla atacante. Um 2-0 é um resultado natural que já não chega para satisfazer as exigências dos adeptos porque Bruno Lage vulgarizou as goleadas. Engraçado. 

Mas a tudo isto chama-se época de uma equipa de futebol que costuma ultrapassar a meia centena de jogos. 

Segue-se nova viagem ao Minho, estamos em ciclo de jogos com equipas minhotas na Liga e essa estreia na Liga dos Campeões com os líderes da Bundesliga na Luz. Uma visita à dimensão maior do futebol mundial numa pausa da limitada realidade do futebol português.