Entrevista a André Sabino - Primeira Parte "A formação do SLB"

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 André Sabino tornou-se conhecido dos adeptos benfiquistas pelo seu incansável trabalho jornalístico, sobretudo, no acompanhamento das camadas jovens do clube encarnado.

Aos poucos, foi-se tornando na maior referência do futebol jovem do Benfica, sendo fonte inesgotável de conhecimento sobre a matéria. Trouxe aos adeptos a paixão pelo futebol jovem, aumentando a visibilidade deste por todo o país, trazendo gente aos campos de futebol para apoiar os jovens e criou um interesse, até então invulgar, pelo jornalismo desportivo referente às camadas jovens.

Quando era parte essencial do desenvolvimento do futebol juvenil do Benfica, ainda que não directamente, decidiu abandonar esse projecto.
Agora, André Sabino explica porque o fez, numa longa entrevista, composta por três partes, onde irá desvendar esta questão e muitas outras.
Esta é a primeira parte dessa entrevista.


A segunda parte sairá na próxima semana e terá como nome "Os Nomes do Benfica".
A terceira parte sairá logo de seguida com o título "Uma vista sobre o futebol jovem"

Entrevistador: Jorge Almeida

1 - Quem segue as camadas jovens e o SerBenfiquista, desde logo percebe uma coisa, a tua grande paixão pelo futebol jovem. Porquê este amor, por este lado menos mediático do desporto-rei?
Acho que sobretudo é uma questão de gosto das pessoas, mas que muitos analistas, em Portugal, insistem em desvalorizar. A crescente importância que o futebol de formação assume nos países europeus, sobretudo nos clubes da elite europeia, é um fenómeno muito interessante de analisar e que me dá especial gozo. Todos os jogadores passam pelo começo, pela sua formação, enquanto que – não estando agora na disponibilidade de dados estatísticos concretos – cerca de 60% deles, isto no nosso país, não atingem a idade de Sénior como futebolistas, seja a nível profissional ou amador.
Este é um dos factores, o facto de ter de existir uma selecção dos melhores, que abrange todo um conjunto de factores muitas vezes invisíveis aos olhos das pessoas. Na formação de um jovem, pode-se fazer de tudo. Eu costumo dizer que se não houver potencial, se não existir um dom, muito dificilmente um jovem chegará a jogador de futebol de alta-roda. Mas, na formação, está-se sempre em desenvolvimento, a melhorar qualidades, a procurar potenciar características, e a entrada no futebol, neste caso profissional, é o sonho de qualquer miúdo. Dá-me especial gosto ver aquele miúdo ainda rebelde, típico da sua idade, chegar ao pé dos mais velhos e fazer coisas que muitos deles por não terem esse talento e irreverência, não conseguem. Costumo dizer que o futebol de formação é ainda o único futebol verdadeiro, sem interesses, onde o gosto pelo futebol e a paixão por este se sobrepõem a qualquer outra coisa.

2 – A outra paixão é, sem dúvida alguma, o Sport Lisboa e Benfica. Como começou esta relação?
Começou um pouco por influência de um parente mas que, ainda em tenra idade, se alargou a níveis inexplicáveis. Há várias histórias que posso contar. Por exemplo, quando era mais jovem, chegava a diferenciar os amigos pela cor clubista (risos). Era uma coisa incrível!

3 – O que é ser benfiquista?
Não se explica... sente-se. Ser benfiquista é algo inexplicável e que só quem ama realmente o clube poderá tentar responder. Eu poderia ficar aqui o resto do dia que não o conseguiria descrever. É uma paixão especial, a única que por mais razões negativas que nos dê, acabaremos por ir sempre dia após dia a procurar os seus sinais, as suas notícias, a sua história. O Benfica é o maior clube português e um dos maiores do Mundo. É a menina dos olhos daqueles que realmente sentem a sua paixão.

4 - Quando se juntaram estes dois amores, o futebol jovem e o Benfica?
Tal como eu costumo dizer, só há amor pelo futebol jovem porque há amor pelo Benfica. E o Benfica despertou-me o interesse das suas camadas mais jovens e foi assim que comecei a acompanhar. Foi através de um amigo que hoje já não pertence aos quadros do clube que lá jogava e fui um dia assistir a um jogo seu. Gostei da experiência e foi então que comecei a acompanhar mais assiduamente as camadas jovens do Benfica e os seus intérpretes. Aí por volta de Maio de 2005.

5 - Tiveste alguns projectos, ligados ao futebol de formação, antes de integrares a equipa do SerBenfiquista?
Antes não. Apenas era praticante federado.

6 – Quando surgiu a hipótese de te juntares ao SerBenfiquista? Conta-nos como surgiu esse desafio.
Foi um pouco de forma casual. Eu já era utilizador do Serbenfiquista quando vi os primeiros jogos da formação e depois a convite de um amigo (Tigerwoodss) comecei a auxiliá-lo em algumas tarefas. Posteriormente, foi existindo um crescimento do contributo da minha parte até chegar aquilo que todos conheceram aqui no site, passando por me juntar também à equipa do Jornal Desporto Jovem (já extinto), do Jornal Noticias da Manhã, da revista Futebolista e de mais um projecto com um conhecido apresentador da RTP mas que deixei em fase prematura para me dedicar a 100% ao que iria fazer no site.

7-Começaste por acompanhar que equipa?
Comecei por acompanhar a equipa de Juvenis A na época 2005/2006. Era a geração de 1989 do nosso clube, a que se juntavam alguns jogadores de 1990, sobretudo um, o David Simão. A então grande esperança da formação do clube, liderada por um talentoso jogador, André Carvalhas, um todo o terreno à Benfica e, na altura, goleador Miguel Rosa, o "sénior" Romeu Ribeiro, o fantástico Ruben Lima e o "patrão" Miguel Vítor.

8- Como foste recebido pelos elementos da equipa, técnicos e jogadores?
Muito melhor do que esperava. Aliás, acho que a simpatia e a vontade de contribuir mas, essencialmente, o seguimento e o feedback que ia sendo dado por todos os responsáveis, foi algo que nunca pensei atingir o ponto que chegou. Naturalmente tenho de estar grato a todas as pessoas intervenientes.

9- Ainda te lembras do teu primeiro jogo como repórter do SerBenfiquista?
Há dois que me lembro bem. O primeiro que vi, um Sporting 3-1 Benfica em Juvenis "A", dessa geração de 1989. Ainda um pouco "às escuras". O primeiro mais "oficial", surge na época seguinte, num Benfica 2-2 Estoril, em Juniores.

10-  Quando começaste por entrar nos meandros da formação, que Benfica encontraste?
Algumas limitações, naturais de quem ainda fazia as mudanças dos Pupilos para o Seixal mas, essencialmente, uma grande vontade de inovar e de conferir o maior profissionalismo possível ao sector de formação do clube.

11-  Como era a relação entre os vários departamentos da formação?
De uma grande união. Havia uma complementaridade de valores muito grande e, ao fim ao cabo, todos estavam dependentes uns dos outros e o "todo" desse bolo iria ser uma riqueza grande para a formação do Benfica. António Carraça era um líder nato e era acompanhado pelo trabalho de Manuel Ribeiro e António Luís, um pouco mais nas "suas costas", mas de extrema importância, e em simultâneo com Bruno Mendes, Rodrigo Magalhães, Bruno Maruta, Jaime Graça, etc.

12- Qual a importância de António Carraça na formação do Benfica?
Crucial. Na minha opinião, António Carraça era uma pessoa extremamente qualificada para o que se pretendia dele. O início foi uma completa mudança. Ele próprio entendeu que havia muito por onde mexer e mexeu mesmo. Acabou com o tempo das pessoas "intocáveis", dos cargos por estatuto, das amizades e dos compadrios. Profissionalizou a formação do Benfica. Se não fez mais, foi porque não lhe deixaram. Em 07/08 tiraram-lhe aquilo que ele próprio tinha "trazido" para o clube: alguns departamentos e a gestão desses mesmos departamentos. Ou seja, o Benfica enquanto clube ganhou muito com a gestão de Carraça, mas tirou-lhe o mérito que ele merecia. Hoje em dia o LORD é conhecido por todos, mas quem trouxe para o Benfica as pessoas que hoje o compõem, e que alertou as mentalidades para a necessidade de ter algo desse género no clube, foi ele. Em termos de números, quando Carraça entrou, o Benfica tinha um departamento de prospecção com cerca de 30 a 50 observadores. Passou para cerca de 300 activos. Abriram-se escolas (modelo que o Sporting "moldou") espalhadas por todo o país e por esse Mundo fora. Fizeram-se protocolos com clubes, designados satélites, para colocar jovens valores, que pela idade não se devem ainda afastar dos pais, desenvolver sob as regras do Benfica, o seu talento, em idade prematura e junto dos seus. Metodologias de treino e inovações a esse nível. Muitos treinos de captação foram realizados por esse país fora. Hoje o Benfica é menos forte em termos de formação e a grande aproximação que teve do Sporting, que com tempo e com as bases feitas, daria ao Benfica uma força interminável nesta área, perdeu-se um pouco.

13-  Que outros nomes apontarias como responsáveis pelo crescimento do futebol juvenil do Benfica?
Sem dúvida alguma António Luís, Bruno Maruta e Rodrigo Magalhães.

14- Em que medida cada um desses nomes contribuiu para o desenvolvimento da formação?
António Luís foi um dos melhores profissionais que conheci ligado ao futebol. Tem uma capacidade de inovação e de profissionalização do trabalho inacreditável. Leva tudo ao pormenor, estuda os detalhes e dá importância à área como um todo, um conjunto de factores que tem de trabalhar em uníssono. Só vendo.

Bruno Maruta pelos seus conhecimentos e qualidade de trabalho. O Benfica cresceu imenso na prospecção.

E Rodrigo Magalhães na área de Iniciação. O seu historial (nos dois primeiros anos que acompanhei) fala por si:
Época 2005/2006
 
  Campeão Distrital de Escolas A
  Campeão Distrital de Escolas B
  Campeão Distrital de Infantis A
  Campeão Distrital de Infantis B
 
  Época 2006/2007
 
  Campeão Distrital de Escolas A
  Campeão Distrital de Escolas B
  Campeão Distrital de Escolas C
  Campeão Distrital de Infantis A
  Campeão Distrital de Iniciados C

15- Falemos agora um pouco sobre essa equipa de Juvenis de 05/06. Quais os seus pontos fortes e pontos fracos.
Era uma equipa muito homogénea. Trabalhava imenso, havia uma evolução e uma complementaridade muito grande e, claro, muito bem orientada a nível técnico, pois havia Bruno Lage. Tinha um guarda-redes forte, o Daniel Casaleiro, que agarrou a titularidade na fase final da época face à lesão do Rui Santos. A defensiva era habitualmente composta pelo André Magalhães à direita, que na altura era um lateral muito duro de ser batido, corria muito e tinha uma óptima capacidade defensiva. Pelo Miguel Vítor e o Flávio Silva como centrais. O Flávio era fortíssimo naquela altura, pois apesar da baixa estatura era o capitão e denotava grande capacidade de desarme, velocidade e garra. O Miguel Vítor era mais discreto. Teve uma evolução gigante na transição para Júnior. Na esquerda era o Ruben Lima. Ele era muito tímido ofensivamente. Defensivamente era o melhor do país e melhorou também muito com Lage.

O meio-campo, se não me engano, era o Romeu Ribeiro como 6. Era um jogador já feito a nível de cultura e de poder defensivo, mas com muito a trabalhar nas transições e no passe. E melhorou muito. Miguel Rosa era o 10, grande talento na altura, sem dúvida o mais completo. Nas Alas, em espécie de 4-4-2 clássico, era à esquerda o Dalibor Stojanovic que fechava muito ao meio, muita garra, muito nervo, bom futebol. À direita o Décio Fernandes que foi dispensado esse ano (Seguiu carreira no Oeiras, penso eu). Era forte no um para um, o único extremo de linha daquele plantel. E o André Carvalhas, fantástico, um prodígio para a altura. E o Bruno Parreira, melhor marcador da equipa. Era um plantel que na altura se fazia muito à base do talento do Rosa e do Carvalhas, mas que era forte a nível colectivo. Perdeu o título por um golo. A diferença está essencialmente que o Sporting já tinha Academia. E o Benfica andava com a casa às costas por tudo o que era campo, sem as condições de trabalho que hoje existem.

16- O que faltou para ter conquistado o titulo?
Essencialmente isso. Outra qualidade de condições. É fantástica a forma como uma equipa sem laboratório que desenvolva as capacidades físicas dos atletas, muitas vezes com treinos a meio-campo, muitas vezes sem estruturas de apoio aos treinos, sem campo pré-definido para a semana seguinte, etc, se aproxima de forma fantástica e, muitas vezes, até mais acima, de um Sporting ou de um Porto, já com "tudo". Era o efeito talento e, o efeito... Bruno Lage.

17- Essa geração, está agora a dar os primeiros passos no futebol sénior. Cinco jogadores dessa equipa assinaram contrato profissional com o Benfica. É, de facto, uma geração de ouro? Ou é uma geração bem trabalhada?
Eu sou apologista de duas coisas. Não pode haver trabalho se não houver talento. Mas se há talento, tem muito por onde se trabalhar. Essa era de facto uma geração com talento, mas que foi sujeita a um grande trabalho do técnico Bruno Lage. Foi ele quem colocou os jogadores a um nível altamente próximo do que as suas capacidades podiam. Trabalhou-os exaustivamente e fê-los potenciar pontos fortes e minimizar pontos fracos em jogo. Era a geração de ouro do Benfica na altura, sem dúvida alguma.

18 – Na tua segunda época, acabaste por acompanhar quase todas as equipas, desde Escolas a Juniores. Notaste evolução de uma época para a outra, ou simplesmente houve uma estagnação?
Senti uma evolução grande. Sobretudo pelas condições. Era a primeira época do Centro de Estágio. E isso veio revolucionar por completo todas as condições e capacidades de trabalho que os atletas e os próprios treinadores e dirigentes até então não tinham.

19 – Em que sectores essa evolução foi mais notória?
Ao nível organizativo e de treino. Passou-se a poder trabalhar de forma exaustiva em várias frentes. Ao nível de treino, mudou praticamente tudo.

20- Centrando a nossa conversa nas equipas que disputaram os campeonatos nacionais, qual o balanço que fazes dessa época?
Começando pelos Juniores, acho que foi uma época brilhante. No início, muitos diziam que a equipa não iria sequer atingir a fase final, que havia falta de qualidade e experiência, e ia ser um ano muito penoso. Acabou-se a lutar pelo título, a virar a fase final em primeiro lugar, e não fossem 6 jogos (selecção nacional sub-18) em 5 dias, incluindo viagem ao Porto, esta equipa tinha sido campeã. Eram 8 jogadores de 1º ano titulares, e nestas idades isso nota-se de forma praticamente decisiva. Mas eles encurtaram distâncias e foram até ao fim. O treinador era... Bruno Lage. Grande época!   

  Também os Juvenis A (Geração de 1990) fez uma excelente época. João Couto entrou para o clube e fez um óptimo trabalho. O Benfica perdeu o título nos descontos quando vencia o Sporting por 1-0. Não é por aí que se analisa um trabalho, mas sim pelo que se fez a nível de individualidades... e no ano seguinte, havia para Juniores, Pedro Eugénio, Abel Pereira, João Pereira, Leandro Pimenta, David Simão, Lassana Camará, André Soares e Rui Ferreira. Muitos deles para a titularidade directa de uma geração fortíssima (a de "ouro", 1989).

Os Iniciados A foram claramente a decepção. Existiram alguns problemas internos, dos quais não vale a pena estar a voltar a referir, e o resultado foi um último lugar. Aqui podia-se ter feito bem mais, sobretudo a nível de 2 ou 3 reforços de qualidade. O treinador era António Bastos Lopes de quem sempre tive uma boa opinião.  [/]

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  21- Fala-nos um pouco da equipa de Iniciados A. Como explicas uma prestação tão fraca?
Falta de qualidade em alguns lugares e os tais problemas internos que referi.


22- Passados dois anos, apenas seis jogadores, desse plantel, continuam no Benfica. A equipa era assim tão fraca a nível individual?
Sim, pode-se dizer que sim. Faltava um guarda-redes de maior qualidade, 2 elementos para a defesa, um trinco para competir com o Marco Oliveira que acabou dispensado para o Braga, um extremo e um ponta-de-lança. Aqui penso que não se olhou como deveria ter acontecido para esta geração. Pontificavam essencialmente dois nomes de grande qualidade: Ruben Pinto e José Graça.


20- Os juvenis acabaram por realizar uma época bem melhor que os iniciados, mas insuficiente para alcançar o título. O que falhou?
Como sempre defendi, vou responder... nada. O Benfica fez uma época muito forte a todos os níveis. Tiveram inúmeras vitórias consecutivas, foram a Alcochete dar 2-0 ao Sporting, tiveram muito fortes durante todo o ano. A fase final foi o seu calcanhar de Aquiles, se não vejamos. Primeiro jogo, deslocação a Alcochete sem Leandro Pimenta, que era uma peça chave da equipa na posição 6, por ele passava todo o futebol da equipa, e Rui Ferreira, demolidor, o melhor marcador do campeonato. Empate a zero. Seguem-se vitórias sobre Boavista e Guimarães. No jogo decisivo, o Benfica estava a ganhar 1-0 ao Sporting, empataram os leões nos descontos, e o Sporting colado ao Benfica na liderança. Segue-se deslocação dificílima ao campo do Guimarães. De agressões ao nosso guarda-redes, a uma arbitragem complicada, o Guimarães ganha e o título está quase entregue ao Sporting. A vitória na última jornada frente ao Boavista não adiantou (o Sporting ganha em Guimarães e é campeão).


21- A entrada de João Couto foi benéfica para este escalão e para o clube?
Sem dúvida alguma. Trouxe uma qualidade diferente ao trabalho com os atletas. Novas ideias e, quanto a mim, uma grande ajuda para o desenvolvimento que se esperava da formação do clube.


22- Fala-nos um pouco sobre essa equipa. Grandes talentos individuais...
A equipa base era. Hugo Figueiredo na baliza, Pedro Eugénio, Abel Pereira, João Pereira e Ricardo Caetano. Leandro Pimenta, Lassana Camará e David Simão. Toumany Sambu, André Soares e Rui Ferreira. O Hugo Figueiredo era um guarda-redes com excelentes reflexos. Foi à fita métrica e foi dispensado no final desse ano. A defesa era de luxo. O Eugénio entrou a seguir ao Couto e tinha uma qualidade muito grande, sobretudo ofensivamente. O Abel era um líder nato, muito forte na altura. O João Pereira era o capitão da selecção. O Caetano ganhava em raça e atitude a todos os outros do campeonato na sua posição.
O Leandro na posição 6 era algo de fantástico, com grande poder de leitura de jogo e passe. O Saná entrou a meio da época. Até então o titular era o Vítor Pacheco. E era menos jogador do que foi na época seguinte, o guineense. O Simão tinha aquele pé esquerdo temível que hoje todos conhecemos.


Toumany... fantástico. Eu vi os primeiros tempos do Toumany. Naquele jeito de africano, até desengonçado, sem cultura táctica, mas fenomenal instinto de finalização. Marcou imensos golos, era um carismático. Não me esqueço dos seus festejos e de todas as alegrias que nos deu. Anti-sporting era o seu lema. O André Soares era, na minha opinião, o melhor jogador da equipa. Um talento fantástico, grande capacidade de finta. Foi desaproveitado pelo João Alves nos seus 2 anos de Júnior. E o Rui Ferreira, outra "vítima" do futuro técnico dos juniores do Benfica. Marcava muitos golos.


23- A equipa de Juniores acabou por realizar uma época bem acima do esperado, pois era constituída por um grande número de jogadores de 1º ano. Era possível ter feito melhor?
Como já disse em cima, penso que não. Aqueles que acompanharam a equipa, pensam assim. Para 90% das pessoas que têm peso na vida diária do clube, as coisas não foram bem assim.


24- Acreditas que é possível vencer o campeonato nacional com um plantel que tem 70% de jogadores de primeiro ano?
É algo extremamente complicado. Acredito que só aquela equipa (1989) e aquele treinador (Bruno Lage) tinham conseguido esse feito.


25- Esse plantel era também formado por onze jogadores vindos da equipa de Juvenis. Numa transição por vezes problemática, este foi um dos melhores aproveitamentos de sempre da equipa de Juvenis. A que se deve esse facto?
À continuidade do trabalho e à estabilidade, duas coisas que parecem ser inimigas da gestão feita no actual mandato de Luís Filipe Vieira. Os frutos estão à vista. Bruno Lage trabalhou, os jogadores trabalharam, juntos, e hoje 5 deles são jogadores profissionais do Benfica. Em quantos anos isto aconteceu na formação do clube? Pois, em mais nenhum...


26- No final da época, os títulos continuavam longe da formação encarnada. Apercebeste-te que isso causou mal-estar entre alguns sectores das camadas jovens?
Sim, sem dúvida. Apesar de não darem essa visibilidade à questão, havia uma clara pressão de resultados. Os títulos iriam ditar o futuro de muitas pessoas, como acabou por se ver no ano seguinte. Havia sobretudo uma união grande entre todas as pessoas da formação, mas uma "luta" a solo, pois na SAD, onde se decide, havia um descrédito daquilo que vinha sendo feito.


27- Esse mal-estar começou-se a materializar de dia para dia? Apercebeste-te de conflitos directos entre pessoas?
Mentiria se dissesse que não. Ao início...os boatos, depois aquilo que estava à vista de todos! Era claro! A imagem de António Carraça começou a desgastar-se junto do presidente, que lhe prometera o comando do departamento de futebol profissional. Estava prometido, como todos sabem. E António Carraça e José Veiga tiveram os seus problemas, como é do conhecimento público, a transbordarem no caso de Diego Souza. A entrada de Rui Águas agudizou essa questão e a saída de Carraça parecia-me inevitável. Na altura que renovou, eu já tinha esse feeling: acabaria por sair, estava-se a preparar o caminho.


28- Iniciada a nova época...com uma surpresa. João Alves como treinador dos Juniores. Quem foi o responsável por esta decisão?
António Carraça era o gestor da formação mas já lhe tinham sido retirados os poderes nessas decisões. Foi uma escolha com o cunho pessoal de Luís Filipe Vieira.


29- Como foi recebida esta notícia na formação benfiquista?
Com bastante alarmismo. Primeiro que tudo foi decidido que Bruno Lage iria sair dos Juniores. Falou-se em Hélder, Zahovic... mas o nome era outro. E foi o início dos problemas, sobretudo porque as mexidas eram incontornáveis e mexia-se agora na parte mais visível, o comando técnico da equipa dos Juniores. Existiram nos primeiros tempos reacções contraditórias e, quanto a mim, parecia que existia uma "barreira" entre os Juniores e o resto, como se tudo até aos Juniores fosse do Benfica e de António Carraça, e os Juniores fossem do Mister João Alves e do Presidente. Foi esta a ideia que com que fiquei.


30- Ficaste surpreendido?
Muito. Não queria acreditar no que se estava a fazer. Apesar de no início dar o benefício da dúvida a João Alves, porque poderia trazer experiência e carisma dos seus anos como Sénior aos jovens... Só que, aconteceu o contrário, foi uma decepção completa.


31- Bruno Lage, após abandonar os Juniores, foi escolhido para treinar os Iniciados A. Uma boa opção?
Esse não era o lugar dele. Na minha opinião, teve de se adaptar às circunstâncias. E fê-lo como ninguém. Foi um ano inteiro a lutar contra muita coisa. Mas teve sempre o apoio de muitos fiéis adeptos.


32- A iniciação evoluiu com Bruno Lage? Em que aspectos?
Imenso. Ao nível de métodos e exigência no sector. Trouxe o carisma de ter estado com uma geração forte e a precisar de mostrar serviço. Ele mais do que ninguém sabia das suas qualidades.


33- Porém, a equipa de Iniciados acabou por não vencer o título. Apenas falta de sorte?
Vejamos, mais uma vez, Bruno Lage partia com um plantel que tinha ficado, salvo erro, em 4º lugar do campeonato distrital de Lisboa. Era, à partida, uma geração com algumas limitações. Bruno Lage evoluiu os jogadores até um nível fantástico (e eu acompanhei a par e passo essa evolução). Na Fase Final onde tudo se decide, o Benfica teve o título na mão em Alcochete mas perdeu o jogo no último fôlego do Sporting ,que podia muito bem ter sido goleado nessa partida. Seguiu-se um empate em casa com o Guimarães e um empate no Seixal com o Sporting. Eles foram os mais equilibrados na fase final. O Benfica foi claramente melhor. Uma injustiça tremenda, mas o reflexo do trabalho estava visível.


34- A equipa, que tão bom futebol praticou ao longo da época, não tinha capacidade psicológica para assumir o favoritismo?
Eu penso que existia um conjunto de factores que acabaram por ser desfavoráveis. Assistimos, a certo momento da época, a uma equipa extremamente forte e com muitas opções. Na Fase Final perdeu-se nos pormenores. E quando assim é, pouco há que se possa fazer. É uma questão de momento, e o Sporting foi mais forte. A nível individual e de potenciação de talentos, o que realmente importa, o Benfica deu 10-0 à concorrência.


35 – Nos juvenis, o caso mudou de figura. A equipa não era tida como favorita, mas venceu, categoricamente, o título. Como foi festejar o título com os atletas e dirigentes?
Foi fantástico. Sobretudo pela forma como foi. Nesse ano o Nelson Oliveira que era o principal jogador da equipa a nível ofensivo, foi à selecção sub-19 e falhou os jogos com o Sporting no Seixal e como Porto no Olival. Era quase ter um ataque completamente diferente. João Couto minorou as distâncias e isso foi fantástico para todo o grupo. Fui ao Porto ver esse jogo e estávamos a perder 3-1 quando entraram o Silvério Camará e o Paul Keita. O jogo dá uma volta de todo o tamanho e vamos empatar 3-3 no Olival, comigo e os outros adeptos benfiquistas presentes a gritarem "BENFICA, BENFICA, BENFICA" e os jogadores a retribuírem com todo o seu empenho em campo.


Guardo com especial carinho o 3º golo! O Ruben Pinto direccionado para nós, a beijar o símbolo, com um gesto de raça e de benfiquismo que jamais esquecerei. E claro, aquele jogo no Seixal com o Porto da 5ª jornada da fase final. A perdermos 1-0 à entrada para os descontos o Porto era campeão. O Diogo Figueiras, acabado de entrar, tira um cruzamento teleguiado para o Silvério Camará encostar. O Porto já não era campeão e tudo se adiava para a última jornada. No último fôlego do Benfica, o Nelson Oliveira foi pela esquerda, insistiu por entre ressaltos, jogou dentro da área onde o Figueiras de pé esquerdo deu o título ao Benfica! O Seixal foi ao rubro, sem palavras!

36- João Couto foi o principal responsável pela vitória?
A certo momento da época sim, mas foi um trabalho conjunto e os jogadores têm de ser também enaltecidos. No entanto, é justo dizer-se que o contributo de João Couto foi essencial. Descobriu um central para jogar ao lado do capitão André Campos, o então trinco Roderick Miranda. Hoje o Roderick já vai à selecção sub-19 (um ano à frente do seu escalão). Foi buscar o Tiago Ribeiro e o André Dias, ainda de primeiro ano, para as laterais da defensiva. Fez do Lassana Camará um jogador brutal. Tornou o Nélson um caso muito sério no futebol de formação, não diria apenas português. Foi também aos sub-16 buscar (e eu gosto de referir sempre isto em tom de brincadeira, com muita insistência minha aqui pelo site) o Ruben Pinto, que se viria a revelar fundamental. Enquadrou o Adul numa equipa já forte. Fez um óptimo trabalho, sem dúvida alguma, com o auxílio, claro, do seu adjunto, Emanuel Ferro.


37- Fala-nos um pouco sobre este plantel de campeões.
Era um plantel, à partida, sem as condições para se ser campeão. Tinha um bom guarda-redes, o Fábio Pereira. Não tinha, no entanto, concorrente à altura. O Tiago Ribeiro era um pouco instável em termos de rendimento. A linha defensiva teve de ser praticamente remodelada e encontraram-se as soluções certas. O meio-campo era o sector mais forte da equipa. Tinha Abdel Vieira, um 6 todo-o-terreno, o Lassana Camará, o melhor jogador da formação em termos globais naquela época, dado que ia aos Juniores e fazia também a diferença, e o Ruben Pinto. O ataque com o Nelson Oliveira em grande forma, fenomenal jogador para aquele escalão. O Toumany que fazia golos atrás de golos, e a irreverência e virtuosismo do Adul. Tornou um plantel relativamente limitado, num conjunto muito forte e que fez valer a sua união e a qualidade individual das peças chaves para chegar ao título.


38- Contudo, desse plantel campeão, apenas 5 jogadores foram admitidos na equipa júnior. Consegues explicar-nos esse estranho caso?
Não! E ainda hoje não encontro explicação para isso. É inacreditável como se aproveita para a equipa seguinte apenas 5 jogadores campeões. O mais grave ainda, é que o João Alves passou 6 meses dessa época a queixar-se que o plantel era curto. Há rumores, e eu estive lá, que no jogo em Setúbal, em que os Juvenis campeões perderam, o João Alves esteve presente (única vez na época que o fez até então, não que tivesse responsabilidade, porque não tem, mas fica sempre bem...) e disse que só 3 ou 4 se aproveitavam para o ano seguinte e o resto não "prestava". O que é certo é que esses 3 ou 4 estavam definidos e mantiveram-se, aos quais se juntou o Figueiras porque foi o herói do título. Acredito que não é só ele o responsável, mas que ficaram por atribuir responsabilidades, lá isso, parece-me óbvio.


39- Na tua opinião, dos jogadores dispensados, quais tinham lugar no plantel de Juniores?
Haviam vários jogadores de 1º ano na equipa base dos Juvenis A, é certo. Mas atletas como o Fábio Pereira, o André Campos, o Abdel Vieira, o Artur Lourenço e o Toumany Sambú... pelo menos estes cinco, nunca deveriam ter sido dispensados. Hoje podem-me dizer que o Fábio Pereira não é titular no Braga. É certo. Mas com que necessidade se vai contratar um guarda-redes ao Odivelas de 2º ano para uma época? O Fábio não podia ter dado continuidade e evoluído para o ano seguinte, o próximo? O André Campos era o capitão de uma equipa campeã. E era de 1º ano. O Abdel Vieira hoje está no Mónaco.


O Artur Lourenço foi e continua a ser, perseguido por lesões. Mas tanto em idade sub-15 como sub-16 foi o melhor jogador do Benfica. Em sub-17 passou grande parte da época lesionado. Não tem direito a isso? O Toumany é o actual melhor marcador do Braga na Zona Norte do campeonato nacional. E era um jogador à Benfica. Foi com muita pena que vi estas saídas.

40- Passando para a equipa de Juniores, as expectativas eram altas...
Altíssimas (interrompendo). Estamos a falar da vice-campeã do ano anterior com 8 jogadores de primeiro ano a titulares, e que eram agora os de 2º ano. A que se juntava a geração de 1990, de grande talento.
 

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  41- Todos apontavam o Benfica como favorito ao título, pois juntava as suas duas melhores gerações. O que falhou?
Falhou alguma coisa, mas faltou essencialmente treinador. João Alves foi uma decepção completa por muitas razões.


42- Descreve-nos esse plantel de quem se dizia maravilhas, mas que nenhuma maravilha fez.
Era um plantel fortíssimo. Tinha nomes de inegável qualidade, a que se juntaram os reforços Demel, Wang, Airton, Wagner e Yartei sob alçada da prospecção, e as apostas pessoais do técnico João Alves, Rogério António, Vlad Chiriches, Abdoulaye e Guido.


43- Desde os primeiros jogos, mesmo quando a equipa vencia, foste sempre um crítico de João Alves. Porquê?
Nos primeiros jogos nem tanto. Repara... o Benfica teve 10 vitórias seguidas. Eu não criticava, mas achava estranho alguma coisa. Achava estranho que a equipa não apresentasse fio de jogo. Achava estranho que a equipa não mostrasse envolvimento colectivo. Achava estranho que não houvesse um modelo de jogo e um sistema de jogo definidos. Achava estranho que todos os jogos se mudasse a equipa. Achava estranho que as substituições de "miúdos" fossem feitas, a primeira, entre os 20 e os 30 minutos de jogo. Achava estranho que um jogador acabasse por fazer 3 ou 4 posições no mesmo jogo... há exemplos claros, Miguel Rosa, Ruben Lima, André Carvalhas.


Depois, começava-se a pensar em algumas coisas e via-se que algo não batia bem. João Alves levou a equipa a... correr na mata como preparação física para o início de época. Coisas dos anos sessenta. Algumas apostas pessoais do treiandor... estranhas e duvidosas. O desaparecimento de valores, como André Soares, Pedro Eugénio e Rui Ferreira. O próprio Leandro Pimenta teve muito pouco jogo. O Benfica chegou à fase final da época sem uma equipa, sem evolução, sem complementaridade, sem grupo e naturalmente... sem título.

44 – As constantes entradas e saídas de jogadores prejudicaram a estabilidade da equipa?
Naturalmente. Entraram numa época 9 jogadores. Para quem está habituado às lides do plantel profissional diria que é normal. Mas numa equipa Júnior é um contra-senso incrível. E ainda por cima há casos inacreditáveis. O Rogério António veio como Guarda-Redes e tinha um certo empresário. Vlad tinha um certo empresário. Abdoulaye idem, Guido idem. Fizeram todos cerca de 3 meses de Benfica, tirando o Vlad que veio logo no início do ano. O Guido, inclusivamente, foi dispensado, mas emprestado à equipa do Atlético (o treinador era e é filho do João Alves), com o Benfica a pagar alojamento, alimentação, ordenado, etc. Estranho? Pois. E em termos de equipa, assistiu-se, a certa altura da época, à máxima de que os jogadores de 2º ano é que tinham de jogar; assim, o titularíssimo David Simão vê a parte decisiva da época no banco, Abel Pereira é adaptado a lateral direito, muda-se constantemente na baliza, etc. Nunca houve estabilidade e um fio condutor nos Juniores.


45 – João Alves, chegou a culpar Camacho pela má época que os juniores estavam a fazer...
Cheguei-me a rir... para não chorar com essa situação. Tudo porque convocou 3 Juniores titularíssimos para um jogo dos Seniores e não os utilizou. Resultado, o Benfica perdeu em Alcochete, mas esteve por cima, e perdeu o jogo na 2ª parte porque João Alves mexeu mal na equipa e leu mal o jogo. Depois, ainda conseguiu não fazer entrar Rui Ferreira e colocar no seu lugar um juvenil de 1º ano, Paul Keita. Indignado, o Rui disse o que não devia e acabou dispensado no ano seguinte.


46- O plantel precisava de ser assim tão reforçado?
Longe disso. O plantel não precisava de reforços. E em 9, o único que parecia reunir condições para poder ser jogador para o futuro do Benfica era o Yartei. E, mesmo assim, com dúvidas. Era de 1º ano e tem muito talento, mas precisava tempo para se adaptar. Havia necessidade de reforçar o ataque, daí Demel e Wang, ainda no tempo de Bruno Lage. Depois foi comprar ao desbarato e com dúvidas relativamente à necessidade de por o nome Benfica no curriculum de alguns nomes contratados para passados 2 e 3 meses irem embora.


47- As saídas de Ruben Lima, Miguel Vitor e Romeu Ribeiro justificavam-se?
Sim. Penso que sobretudo os dois últimos já tinham mostrado todo um conjunto de qualidades que deveriam ser exponenciadas. Deviam sair para uma liga mais competitiva e ter outra obrigatoriedade competitiva que não tinham no nacional de Juniores. E eu próprio "bati" nessa tecla várias vezes antes de se oficializar essas saídas. Com o Ruben Lima foi quase como que uma forma de salvamento. Ele em 5 meses já tinha jogado como central em sistema de 4 defesas e central em sistema de 3, médio ala defensivo, médio interior e extremo Esquerdo...


48- Faz-nos um balanço da época dos Juniores. Positivo e negativo.
O Benfica pecou sobretudo por algumas opções discutíveis da parte do seu treinador e que se reflectiram no desempenho do grupo. É certo que jogadores como Romeu Ribeiro, Ruben Lima e Miguel Vítor poderiam ter dado outra maturidade e qualidade ao plantel e, assim, talvez o título estivesse mais próximo, mas, sobretudo, em termos de evolução dos jogadores, estabilização de rotinas, potencialização dos sub-18 para o próximo ano, balanço de reforços, o ano foi negativo. 

Relembre-se que chegaram, viram, jogaram, e pouco tempo depois, foram embora, Rogério António e Guido Abayian. Vlad Chiriches lesionou-se, mas sempre mostrou muito pouco. Wagner Silva foi uma má aposta. Wang Gang revelou não ser o tipo de jogador esperado. Abdoulaye Fall deu qualidade, mas não mostrou ser amplamente superior a Leandro Pimenta e David Simão. Sendo assim, Ismmael Yartei, Airton Oliveira e Orphee Demel foram os verdadeiros reforços desta temporada que trouxeram qualidade superior ao plantel.
Carlos Correia, única opção aparente para o lado direito do ataque, e que na pré-época revelou-se como um dos melhores, foi dispensado. André Magalhães, um jogador com 9 anos de casa, deixou de ser opção. Pedro Eugénio, aparentemente o melhor lateral direito do plantel, foi dispensado o que obrigou Abel Pereira a ser recurso como Lateral. David Simão foi dos melhores ao longo do ano, deixou de ser opção na Fase Final com uma saída à meia hora em Alvalade, depois de ter estado no banco nos jogos finais da fase regular. Leandro Pimenta jogou muito pouco, tendo em conta que seria à partida o médio mais equilibrado do plantel a par de Miguel Rosa.


André Soares fez apenas dois ou três jogos na sua posição natural, a de Extremo Esquerdo. Rui Ferreira, cedo deixou de ser aposta, ele que tinha sido o melhor marcador do nacional de Juvenis.
De positivo, infelizmente, há pouco, na minha opinião. Há o surgimento de David Simão numa posição mais recuada e que vai ao encontro de potenciar melhor as suas características. E eu, pessoalmente, vislumbro pouco mais.


49- Ainda antes da época terminar, deu-se a saída de António Carraça. Sempre defendeste que era uma perda gravíssima para o clube. Porquê?
Pela liderança, pela competência, pelo conhecimento e sobretudo pela forma como trabalhava na área de formação. Como já disse anteriormente, ele praticamente saiu no início do ano. Oficializou-se apenas no final, o que deixou o Benfica um pouco à deriva na área de formação, especialmente nos Juniores. Daí que Alves tinha liberdade para tudo. O António Carraça estava a fazer um trabalho que ia dar os seus frutos. E eu tinha a certeza que sim. E já deu. Ai está Miguel Vítor; e muitos mais virão. Foi com muita tristeza que vi a sua saída, muito também pelos factores que disse no início da entrevista.


50- Apercebeste-te que Carraça era persona non grata?
Sim. A sua forma de estar colidiu com alguns interesses implementados e com o facto de entrar em choque com algumas ilustres figuras que trabalhavam directamente no futebol profissional, o que desgastou a sua imagem junto da gestão.


51- Quais os motivos que levaram à saída do até então cérebro da formação benfiquista?
Esses mesmos. A que se juntou, a falta de um título nacional para poder responder às críticas.


52- Já antes acontecera a saída de António Luís, o que também não te agradou...
Foi o início do desmoronamento da base que estava então em  trabalho. Era uma peça fundamental na área. Penso que o Benfica perdeu imenso. Ele desenvolveu um programa de base de dados que o Benfica posteriormente tentou comprar. Era um "génio" no que fazia.


53- E Bruno Maruta, porque não ficou no Benfica?
Não chegou a acordo com a direcção. Não o valorizaram e não lhe deram o que queria (não monetariamente). Passou a figura de 2º plano com a entrada de Rui Águas e no ano seguinte deu-se a saída.


54- Alguns consideram que não se ter proposto um novo contrato a Maruta foi um acto de auto-flagelação. Concordas?
Concordo. Maruta era um profissional extremamente competente e um dos grandes responsáveis pela prospecção do Benfica ser, a nível de recursos e de trabalho, a que melhores resultados estava a apresentar no país. Isso reflectia-se nos campeonatos ganhos em escalões inferiores. O problema é que no Benfica, não se dá tempo a ninguém.


55- Foi um Verão muito quente a nível de bastidores, pelos lados do Seixal. Pode-se dizer que chegou a haver um clima de guerra-fria entre alguns nomes do futebol benfiquista?
É exagerar um pouco nas palavras mas havia claramente muitas cisões na área. Existiam pessoas com altos cargos de decisão e que simplesmente não se falavam.


56- Logo no início da época, veio a público um documento, alegadamente elaborado por alguns prospectores e coordenadores, no qual eram criticadas algumas políticas recentes. O que se criticava esse documento?
Empolou-se na saída do Maruta. Eles, que o conheciam melhor que ninguém, sabiam o erro que o Benfica estava a cometer. Rui Costa estava à parte do tema pois estava à pouquíssimo tempo em funções. E apelaram ao seu bom senso. Sem sorte. O facto do substituto de Maruta ter entrado para part-time, foi um retrocesso elevadíssimo no que existia. Maruta, como eu costumo dizer, fazia 25 horas por dia de trabalho e eu dizia que ele devia ter trabalhado mais uma porque não tinha chegado. E reduzir para part-time, não direi que é uma humilhação para com as pessoas que trabalharam estes anos recentes, mas que é um amadorismo inacreditável para um clube como o Benfica, lá isso...


57- Concordas com o que está explicito nesse texto?
A 100%.


58- Porque não foram divulgados os nomes dos coordenadores e prospectores que elaboraram esse documento?
Por terem medo de sofrerem represálias a nível directivo. No fundo queriam apenas ajudar o Benfica e vivem o Benfica tão, ou mais, intensamente do que nós.


59- Qual o clima que se vive, entre directores, treinadores e coordenadores, neste momento? Há um clima de submissão absoluta e de medo?
Neste momento não. As coisas estão mais calmas pelo que me é dado a parecer. Parece-me também, que no final da época teremos novamente mudanças, entradas e saídas. A saída de António Carraça vinha trazer isto, mais cedo ou mais tarde. A porta da formação do Benfica estava apenas aberta aos melhores. Desviou-se desse caminho e hoje as mexidas são frequentes e a base da estrutura é alvo de constantes alterações.


60- Sofreste alguma forma de pressão, durante a última época?
Não, nunca o senti, bem pelo contrário. Existia por parte de todas as pessoas uma palavra amiga e a maior das disponibilidades para auxiliar o trabalho que era realizado para o Serbenfiquista. Tenho de estar totalmente grato a todos.


61- Muitos consideravam-te a grande referência da formação benfiquista. O elo entre os adeptos e a formação. Sentias esse carinho nas bancadas?
Sim, de certa forma. Acredito que muitas pessoas que ali estavam, acompanhavam o site e era lá que procuravam saber as novidades da formação. Acabavam por ter naquele espaço da internet um "chamariz" para estarem ali, naquela altura. Muitas pessoas abordavam-me e davam-me os parabéns, ao que eu procurei sempre responder com o meu trabalho.


62- Sei que chegaste a receber elogios de elementos da formação portista e sportinguista. Como foi receber elogios dos rivais?
É bom para o ego (risos). Não creio que alguma vez tenha entrado no caminho do "ataque" à formação dos outros clubes e às suas equipas. É normal que ao defender o nosso clube, de vez em quando, mandemos uma boca ou outra aos adversários, mas sempre mantive o respeito e elogiei, sempre que foi necessário, os adversários.


63- No início desta época, caiu uma bomba no fórum, quando anunciaste a tua decisão de abandonares o trabalho que vinhas feito até então. Inúmeros users pediram-te que reconsiderasses, pois diziam que eras insubstituível. Chegaste a reconsiderar?
Cheguei! Ainda pensei mais uma vez, mas sabia que a minha decisão estava tomada. Era uma coisa que eu já tinha pensado, que tinha decidido para mim e para o meu futuro. Não quis voltar com a palavra atrás. Tenho de estar agradecido por todas essas manifestações de apoio e, do fundo do coração, um muito obrigado a todos, um a um, por tudo o que foram para mim e, essencialmente, para o meu trabalho ao longo destes dois anos e pouco.


64- Agora, a pergunta inevitável. Porque saíste do Serbenfiquista?
Mentiria se dissesse que foram apenas motivos pessoais. Não quero responsabilizar ninguém, porque a decisão é minha e eu assumo-a inteiramente. No entanto, existiram algumas decisões dentro do Benfica, algumas medidas, que me desagradaram. Eu, fazendo as coisas por gosto, olhando para o rumo daquilo que foi construído, e que de forma orgulhosa, de certa forma, também ajudei a essa construção, estava a desmoronar-se... não quero compactuar, nem alcanço, enquanto benfiquista, aceitar algumas coisas menos boas que se vão fazendo e fechar os olhos e seguir em frente. Continuo atento e fervoroso adepto da formação. No entanto, senti que tinha de me distanciar de certa forma para não melindrar o que vinha fazendo. Posso dizer que preferi sair na altura certa e, se ela existe, pela porta grande.


65- Tens saudades?
Sim, quando se fazem as coisas por amor ao clube, por carolice, há muitas alturas que sinto saudades, mas tento não pensar muito nisso e esperar serenamente pelo desenvolvimento das coisas. Procurei encontrar pessoas que me substituíssem no site e estou muito satisfeito com os resultados: o Pedro Pires e o Jorge Almeida são duas pessoas cheias de talento e tenho a certeza de que estão a honrar e a melhorar aquilo que vinha sendo feito.


66- Tens acompanhado a evolução das equipas este ano?
Sim, procuro seguir na medida do possível. Já assisti a alguns jogos este ano, a menos do que gostava certamente, mas também faz parte da estratégia "anti-saudades" que assim seja (risos).


67- Pedia-te uma breve análise à equipa de Iniciados, à de Juvenis e à de Juniores.
Os Iniciados são uma equipa com alguns talentos individuais e que veio ganhar muito com o Diego. Porém, começaram em desvantagem para com o Sporting. No entanto, o trabalho que tem vindo a ser feito é muito forte e os jogadores estão a evoluir a olhos vistos.
Os Juvenis continuam com alguns problemas. Esta geração voltou a não ser reforçada na medida do que precisava, mas com trabalho e ambição, poderão ser candidatos ao título. Porém, para já, penso que seja preciso algo mais para poder ambicionar a esse estatuto de forma clara.


Os Juniores são aquilo que todos sabemos. Uma equipa cheia de talentos individuais, mas que teimam em não aparecer, exceptuando um ou outro elemento, nomeadamente, o David Simão que parece imune a tudo. Falta-lhes claramente um treinador à altura do seu talento.


68- Poderão chegar títulos ao Seixal?
Sim, poderão... mas vejamos:
O Sporting é o todo poderoso nos Iniciados. O Benfica é o outsider.
Nos Juvenis, não nos consideram candidatos.
Nos Juniores, em que pelo 2º ano seguido, somos os principais candidatos, não estamos preparados, pois o trabalho desenvolvido pelo treinador não tem ajudado a equipa a crescer, a evoluir em conjunto e a criar as rotinas necessárias para se formar uma equipa campeã. Gostava que me contrariassem mas realisticamente não acredito. Vamos ver.


69- E jogadores à equipa sénior?
Actualmente... é uma questão de sorte. Aquilo que deveria ser um processo contínuo e com a margem de erro menor, torna-se agora num bicho-de-sete-cabeças, pois os jogadores simplesmente não evoluem enquanto Juniores. No entanto, pelo talento que possuem, David Simão, Lassana Camará e Nelson Oliveira podem ambicionar a curto-médio-prazo atingir esse sonho.


70- Como vês o futuro da formação encarnada?

O Benfica, como maior clube português e um dos maiores do Mundo, tem de potenciar essa área e tem uma capacidade de crescimento enorme. Eu acredito que hoje já estaríamos muito mais desenvolvidos neste sector do que o que estamos, se tivéssemos mantido no clube pessoas como o António Carraça, António Luís e Bruno Maruta. Demos passos atrás e, sinceramente, estou algo apreensivo. Mas espero certamente que o rumo a seguir seja, novamente, de crescimento e evolução.


71- Viste jogar centenas de jogadores no tempo em que acompanhaste a formação benfiquista...Peço-te que faças um onze com os melhores jogadores que tiveste a oportunidade de ver.

Só do Benfica? É algo complicado, sobretudo pela diferença de idades entre jogadores e capacidade actual, atendendo ao potencial que demonstram, mas vou arriscar – também de outros clubes.


Benfica (em 4-3-3): José Costa; Pedro Almeida, Miguel Vítor, João Santos e Ruben Lima; Romeu Ribeiro, Lassana Camará e David Simão; André Carvalhas, Nelson Oliveira e Sancidino Silva.


Formação global (em 4-3-3): Rui Patrício (Sporting); Paulinho (FC Porto), Miguel Vítor (Benfica), Daniel Carriço (Sporting) e Ruben Lima (Benfica); Romeu Ribeiro (Benfica), Adrien Silva (Sporting) e David Simão (Benfica); André Carvalhas (Benfica), Diogo Rosado (Sporting) e Lucas (Vitória SC).     


Entrevista realizada por Jorge Almeida   

Red skin

Espero ver o André como responsável das Camadas Jovens do glorioso!!!!

Continua!!!  :clap1:

faneca_slb4ever

André tenho a impressão que tens grande talento para descobrir jovens...Prospecção Benfica te espera  :slb2: :slb2:

ET


fmb

excelente entrevista André....  :clap1:
estás de parabéns, e tal como tu, espero que as pessoas que comandam o Benfica voltem a pôr os olhos no estado da nossa formação!!!

Filipe F

Excelente entrevista André e Jorginho... Esperamos que a formação volte a dar uma grande volta para melhor... Sinceramente se fosse a época passada teria estado no Seixal no passado fim-de-semana a assistir ao jogo de juniores, mas com o treinador que temos, levou-me aos pavilhões a assistir ao futsal e ao basquetebol.


JG10


Miguelg

Grande entrevista amigo, sabes que mais se fosse sem cunha já estavas a trabalhar na formação, aprendeste e muito com quem sabe, mas como não tens cunha vais nos deliciando com estes PEQUENOS contibutos.

PS:Gostava de te ver na Benfica TV num programasobre formação

Ricardo Oliveira

Citação de: Filipe F em 01 de Abril de 2009, 14:43
Excelente entrevista André e Jorginho... Esperamos que a formação volte a dar uma grande volta para melhor... Sinceramente se fosse a época passada teria estado no Seixal no passado fim-de-semana a assistir ao jogo de juniores, mas com o treinador que temos, levou-me aos pavilhões a assistir ao futsal e ao basquetebol.

Situação exactamente igual à minha...dói ir a um jogo dos juniores e imaginar o potencial daquela equipa se fosse treinada por outra pessoa.
Nunca fui muito próximo da situção da formação do Benfica, acompanhava apenas o via nos jornais. Esta entrevista deu-me a perceber que foram dados muitos tiros nos pés, poderíamos estar agora a tirar proveitos muitos maiores dos jovens que têm passado pelo Seixal.
Gostava de saber agora o que pensa o Rui Costa, já com quase um ano de casa, da formação do Benfica.
Costumo ir ver os iniciados ao Seixal, mas só conheço 4/5 jogadores, não associo os nomes que vejo aqui no fórum aos jogadores,no próximo jogo alguém me pode dar umas dicas sobre os jogadores que jogam?

BENFICA Sempre!!! :slb2:

Dudek

Muito boa entrevista! valeu bem a pena ler, obrigado por tudo o que tens dado ao Benfica/Serbenfiquista   :amigo:

Nramos


Ribas1

Estranhei não meteres o Saná no 11 da Formação Global!

Quanto ao texto, é realmente frustrante lermos o desenrolar da tua opinião acerca das equipas de Juniores com o passar dos anos, é triste percebermos nesta analise que a pessoa que actualmente está á frente da equipa está a deitar para o lixo o trabalho de tão bons profissionais, e o talento de tantos jogadores que tanto prometiam!

Pena é que por mais razão que a maioria dos users te dêm a tua opinião não seja lida(e ouvida) por quem realmente pode fazer algo, ou se essas pessoas sabem da tua opinião (que é simultaneamente a opinião de muito boa gente) não agiram ainda para corrigir erros gravissimos e que põem em causa o futuro de tantos jogadores..

Obrigado por todo o teu trabalho passado e espero que te voltes a envolver mais na formação do nosso Benfica, até porque seria sinal que o nosso clube estaria novamente num bom rumo.

Abraço