Fonte
www.orecord.pt
– Qual é o balanço dos primeiros 15 dias de Benfica?
– Não tenho tido muito tempo para saborear o clube com tantos jogos e treinos. Estou contente porque está tudo a correr bem, para já, e porque nos aproximámos dos lugares em que o Benfica deve estar sempre. Depois do jogo com o Boavista vai haver um período de miniférias. Estamos quase na segunda volta e, aí sim, podemos ter mais calma e trabalhar mais e melhor. Num primeiro momento, o objectivo era não perder pontos, nem descer na classificação. Conseguimos esse objectivo, apesar de defrontar uma série de equipas que estão nos primeiros lugares.
– E a adaptação à instituição?
– Para me adaptar totalmente à instituição preciso de tempo para me identificar com as pessoas do clube. Por agora, percebi aquilo que já sabia: que o Benfica é um grande clube. Em qualquer restaurante, ou loja, ou mesmo na rua, toda a gente fala comigo e deseja-me sorte. Os adeptos dizem-me que querem ver a grandeza do Benfica recuperada no futebol português, mas também a nível internacional. É isso o que eu quero fazer e dar ao clube. Quero dar dimensão internacional ao Benfica. Estamos a construir um estádio novo e isso, se por um lado deixa as pessoas com ilusão, por outro condiciona e traz problemas que devemos resolver no campo.
– Disse que o Benfica precisa de jogadores identificados com o clube. Um treinador também precisa de se identificar com a instituição?
– Não é o mesmo. Não é normal não ter jogadores identificados com o clube, com cinco anos de casa, por exemplo, como já disse. Normalmente, qualquer clube desta grandeza tem-nos. Aqui, no balneário, não há ninguém assim. Claro que há o Chalana, o Simões ou o Eusébio... Mas no plantel propriamente dito não há ninguém. Há um ano e meio a maioria dos jogadores do Benfica representava e defendia as cores de outro clube. Como os técnicos principais não passam mais de três anos num clube, não necessitam tanto de se identificarem com ele.
– O objectivo é o título ou a Liga dos Campeões?
– É ganhar ao Boavista. O resto logo vemos.
– Mas concorda que o título vai ser decidido a dois?
– Neste momento, acho que vai ser decidido por uma equipa. Quem está na frente é que é favorito e candidato. Ao Benfica compete não perder terreno, ir ganhando os seus jogos. Se ganharmos os nossos jogos, chegaremos à frente, sem dúvida.
– O FC Porto é o principal candidato?
– O FC Porto tem uma vantagem clara, tem dominado o campeonato até agora, sem dúvidas nenhumas. A nós compete-nos estar atentos e defender o segundo lugar. Se não o fizermos, nem sequer podemos pensar no primeiro.
– Viu o jogo de segunda-feira entre FC Porto e Paços de Ferreira?
– Sim. Foi a prova de que não há jogos fáceis, nem jogos iguais.
– O que tem a dizer sobre a polémica arbitragem de Paulo Paraty?
– Isso é conversa de rua. Os árbitros tentam sempre fazer o melhor possível, mas há alturas em que se enganam. Num jogo, as duas equipas são prejudicadas e beneficiadas, mas só se repara nos erros quando eles têm influência no resultado. Mesmo que antes tenha havido um erro muito mais grave. Tento sempre que os meus jogadores se preocupem com eles mesmos e só com eles mesmos.
– Já sente que há um onze-base?
– Não. Porque para o último jogo houve uma série de impedimentos, para o próximo também, por isso...
– As lesões têm sido um problema?
– Mas isso as pessoas não vêem. O que interessa é ganhar, claro. Mas praticamente não conheço o Roger, o Sokota ou o Carlitos.
– Resulta a ideia, para quem vê o Benfica jogar, que Argel é o patrão da equipa, pelo menos na zona defensiva. Concorda?
– Toda a gente na rua fala da equipa. Penso é que, em campo, toda a gente tem a sua personalidade, o que é diferente. Eu também me fartava de falar e de gritar quando jogava.
– E isso é ou não importante?
– Pode ser. Mas não quer dizer que seja o patrão. É bom haver uma voz de comando, mas também há jogadores que não gostam que lhe estejam sempre a chamar a atenção. É assim no campo, como é no balneário, como é em qualquer casa de qualquer pessoa.
– Outra ideia que salta à vista de quem vê os jogos é que Simão é meia equipa. Concorda?
– Todos são importantes. Todos. Cada um tem a sua função e deve-se sentir importante. Um jogador sem os outros não é nada.
– Mas se o Simão se lesiona é um problema maior do que qualquer outro.
– Sim. Mas o que têm de ter todos os jogadores é a mentalidade aberta para tentarem ajudar a equipa a ganhar. Simão tem características na equipa que agradam mais aos adeptos ou à Imprensa: dribla, tem velocidade, marca golos. Mas há outros que têm de parar o jogo adversário, que têm de fazer a bola girar.
– O Tiago foi a maior surpresa que teve?
– Vamos com calma. Só fiz três jogos. Há jogadores que são importantes, a meio da temporada saem da equipa e no final nem são convocados. E vice-versa. Estou contente com todos.
– O anterior treinador diagnosticou um problema na equipa: a necessidade de dispor de mais um guarda-redes para concorrer com Moreira. Discorda?
– Não devo responder. Se o jogador em causa lê esta entrevista, pode ser complicado.
– O Ricardo Rocha à direita é uma opção para manter?
– Ele já demonstrou poder jogar ao meio, à direita ou à esquerda, dependendo das necessidades.
– Mas normalmente prefere jogar com laterais de raiz.
– Sim. Mas isso dependerá de muita coisa e da disponibilidade do plantel. Em Portugal utiliza-se muito os extremos e pode ser importante ter um jogador com as suas características nesse lugar.
«Reforços não podem deixar dúvidas»
– Ficou decepcionado ou iludido com o plantel que tem à disposição, partindo do princípio que vem de uma liga, a espanhola, com mais qualidade?
– Não fiquei nada decepcionado. Nós temos de adaptar-nos a tudo. Há é maneiras de trabalhar e de treinar diferentes.
– Considera o número de jogadores do plantel (27) excessivo?
– Sim. São muitos mas temos de respeitá-los. Não jogamos nas competições europeias nem na Taça de Portugal por isso não se justifica tanta gente. Há 11 que jogam e 16 que ficam de fora, é demais. Até porque os jogadores precisam de saber que podem ser opção, para não se desconcentrarem, para não perderem eficácia, para se manterem activos.
– Vão sair quantos jogadores do plantel em Janeiro?
– Ainda não fizemos nada nesse sentido e não vamos fazer até ao jogo com o Boavista. Não é meu estilo chegar perto de um atleta e dizer-lhe que se vai embora ou que se vai treinar à parte. O mercado só abre dia 1 de Janeiro e aí veremos. Há jogadores a quem poderemos dizer: "Olha tens aqui uma possibilidade de jogar mais".
– Mas haverá mexidas em Janeiro?
- Sim, em todos os clubes isso deve acontecer.
– Quais os reforços de que necessita?
– Não quero falar nem de entradas, nem de saídas.
– Mas com a lesão de Mantorras, por exemplo, encontrou um novo problema...
– Sim, isso sim. Já havia problemas nas faixas laterais em matéria ofensiva e agora há mais um. Se um jogador como Simão é castigado ou se lesiona nota-se muito. Outros plantéis têm mais soluções nessas zonas e o Benfica também quer ter. Noutras posições, temos muitos jogadores mas aí não. Devemos compensar.
– Ou seja, a zona central do terreno não é problemática. O problema está só nas alas?
– Creio que sim, porque há baixas de forma e castigos que devem ser compensados. Para o jogo com o Boavista, por exemplo, não vamos poder jogar nem com Tiago, nem com Petit mas, apesar de tudo, temos soluções para esses lugares.
– Resumindo: em Janeiro vai pedir a Luís Filipe Vieira um reforço para as alas e dois laterais, um esquerdo e um direito?
– Em Janeiro falaremos. Um clube nunca pára. Mesmo que um clube ganhe tudo o que há para ganhar, desde a taça, ao campeonato ou às competições europeias, há sempre entradas e saídas. Acontece em todos os clubes do Mundo. Para já, o que sei é que quem entrar terá de ser um reforço verdadeiro.
– Um titular?
– Sim. Ou que lute pela titularidade. Trazer jogadores que não subam a qualidade do plantel ou que não superem o seu concorrente directo não vale a pena virem.
– Vai privilegiar jogadores que já conhece?
– Sim, claro. Jogadores que eu conheça ou que o clube conheça muito bem. Jogadores que não deixem dúvidas.
– Portugueses ou estrangeiros?
– De qualidade.
– Comprar jogadores de qualidade não é fácil, até tendo em conta as limitações do mercado e os problemas financeiros do Benfica. Como pensa que os dirigentes vão tornear a questão?
– Não é fácil encontrar bons jogadores no mercado. E sei que o clube não atravessa uma fase desafogada. Mas os sócios querem vitórias e para isso é necessário termos jogadores de qualidade.
Cinco alas à disposição no plantel
José Antonio Camacho já identificou um dos problemas do plantel do Benfica. Na opinião do espanhol, faltam jogadores para as alas.
Neste momento, para o lado direito e esquerdo do meio-campo/ataque, o Benfica dispõe de Simão, Carlitos, Miguel, Mantorras ou Drulovic.
Mas o angolano – que Camacho define como ala e não ponta-de-lança – foi operado segunda-feira e Carlitos mantém-se com problemas musculares. Sobram Miguel, que também é utilizado a lateral, Simão e Drulovic. Em Janeiro podem vir a ser mais.
«Vamos jogar para vencer no Bessa»
Camacho mantém o mesmo discurso antes da deslocação ao Bessa, no próximo fim-de-semana. Quer vencer o Boavista e promete que a sua equipa vai fazer tudo para isso, apesar de confirmar a ausência de Petit, além da de Tiago.
"O jogo com o Boavista vai ser encarado da mesma forma que os outros. Queremos vencer e vamos lutar para o fazer. Já vi o Boavista jogar com o Paris Saint-Germain e sei que é uma equipa que está a melhorar e é forte", afirmou o técnico espanhol.
Em relação à ausência dos dois médios: "São duas baixas importantes. Mas temos soluções em que confiamos no plantel. Em princípio, não haverá necessidade de adaptações. Logo veremos", prosseguiu Camacho, dando a entender que Andersson, Peixe ou Andrade são hipóteses viáveis para o encontro.
Antes do próximo jogo, o espanhol falou do anterior, com o Belenenses. "Em futebol, o que interessa é chegar à baliza adversária. E nós fizemo-lo. O adversário dificultou mas este jogo poderia ter acabado 3-0 e aí até parecia que tínhamos jogado muito melhor."
Mora na antiga casa de Jardel
Depois de duas semanas hospedado no Hotel Marriott, em Lisboa, o novo treinador do Benfica já tem casa em Lisboa. José Antonio Camacho escolheu a antiga casa de Mário Jardel, goleador do Sporting, na zona das Laranjeiras, perto do Estádio da Luz e também do Estádio Universitário, onde a equipa às vezes trabalha durante a semana.
Barça e Madrid são especulação
O nome de Camacho começa a ser falado em Espanha para treinar o Barcelona, em crise, ou o Real Madrid, clube de que é referência. O treinador nega contactos e afasta cenários especulativos, sobretudo a propósito dos catalães: "Se podia treinar o Barça? Não falo no condicional. Se poderia, se me vejo... Vejo-me a treinar o Benfica e isso é que me interessa neste momento."
Boa relação com Vieira
Na carreira de Camacho são frequentes os choques de personalidade com os dirigentes dos clubes que orientou. Com Luís Filipe Vieira, a relação, para já, é boa. "Com o sr. Luís Filipe Vieira tenho jantado uma vez ou outra. Tenho uma boa relação. Converso e estou mais próximo do António (Simões). Corre tudo com normalidade a nível directivo, por agora."