NENE

Nené no Observatório Benfiquista Os meus 24.920 minutos no Estádio da Luz Para vos explicar a tristeza que senti no sábado em que o Benfica jogou com o Santa Clara e se despediu do Estádio da Luz tenho de vos contar como é que eu, há 26 anos, cheguei ao Estádio da Luz, onde vivi sózinho, no Lar do Jogador, os meus primeiros dois anos de vida em Lisboa, longe da família, muito longe da família, lá longe, noutro continente. Não sei como vos hei-de descrever a alegria que senti quando pelo final de 1966 o Benfica contactou os meus pais no sentido de eu ingressar nos quadros do futebol do clube. Eu vivia em na Beira, em Moçambique, era um garoto, um júnior do Ferroviário que se vinha destacando por marcar uns golitos, afinal a coisa que sempre soube fazer ao longo de toda a minha carreira. Costumo dizer que devo a um jornal a minha vinda para o Benfica. Mais precisamente ao "Notícias da Beira" que, um certo dia, publicou uma fotografia minha a jogar à bola, com a seguinte legenda por baixo: "o melhor júnior do futebol moçambicano". Alguém ligado ao Benfica reparou e não foi preciso esperar muito tempo até que o convite oficial surgisse. A minha casa quase vinha abaixo. Eu venho de uma família de jogadores de futebol - o Cavém era meu primo - e, muito principalmente, de uma família de benfiquistas. Portanto, será fácil imginar a festa que foi lá em casa. Aterrei em Lisboa no dia 7 de Fevereiro de 1967 e fui direitinho ao Estádio da Luz, ao Lar do Jogador. A primeira impressão que tive do Estádio foi esmagadora. Era tudo aquilo que eu estava à espera e muito mais. Lembro-me do primeiro jogo oficial que fiz com a camisola do Benfica, contra o Olhanense, na Luz, ganhámos 3-0 e eu marquei um dos golos. A estreia foi auspiciosa. Na época seguinte, 1967/68, sagrei-me campeão nacional de juniores. Foi o meu primeiro título pelo Benfica. O primeiro de muitos. E de muitas alegrias, a maior parte delas vividas no Estádio de que me despedi, com o coração a sangrar, há poucos dias. Tenho orgulho em ter sido o jogador que, com a camisola do Glorioso, mais vezes jogou no Estádio da Luz. Fiz 315 jogos [230 completos, 53 em que fui substituído e 32 como suplente utilizado], num total de 24.920 minutos e... 252 golos! Como jogador de futebol estive 19 anos, vinte épocas no Benfica. Hoje continuo ligado profissionalmente ao clube, trabalhando no departamento de futebol juvenil. No dia da monumental despedida do Estádio da Luz ainda fiz uma "perninha", joguei uns minutos com aquela camisola vermelha e de águia ao peito. Não consegui conter as lágrimas. Estive no Estádio todo o dia, toda a noite, saí de lá de madrugada. Quis aproveitar todos os minutos, todos os segundos daquele momento. E tomei uma decisão. Nunca mais jogo futebol. Enfim, era isto que vos queria dizer. Aos 53 anos, vou finamente "arrumar as botas". Depois do Estádio da Luz, não jogo em mais lado nenhum.