Entrevista com Vera Bettencourt

Bessem Jday

«Grande entrevista» Vera Bettencourt    
 
Vera Bettencourt é a treinadora portuguesa com maior sucesso no passado recente, foram muitos os títulos conquistados no Benfica no qual se destaca uma taça Ibérica, que continua ser o único título internacional conquistado por uma equipa portuguesa. Vera deixou o Benfica no início da época e diz-se pronta para abraçar um novo projecto, desta feita no masculino.

 

Como se tem estado a sentir nesta nova etapa da sua vida?

A minha vida está a ser bastante calma, já tinha saudades de ter mais tempo para mim, para o meu filho e para a pessoa que vive comigo. Há cinco anos que não sabia o que era ter um fim de semana e por isso estou a gostar imenso. Ainda não sinto falta da ansiedade e pressão dos jogos, estou muito bem neste momento.

O que tem estado a fazer ao nível do futsal?

Estou a dedicar-me a uma área que faz parte da minha evolução como treinadora. Gosto muito de treinar, acabei de tirar o 3º nível e achei que queria mais. Passei por todos os escalões do Benfica enquanto treinadora, tive a sorte de ser campeã em todos e achei que queria mais. Quero evoluir enquanto pessoa, enquanto treinador e quero atingir outros patamares. Neste momento tenho a minha academia de futsal e futebol, um projecto já com dois anos e que agora estou a pô-lo em prática. As coisas estão a correr bem, o espaço físico é na Beloura e agora vamos abrir outra na Amadora.

Neste momento a academia Vera Bettencourt é uma realidade e o nosso lema é «uma academia para todos». A exclusão social não existe e como tal este projecto está a dar-me imenso prazer, estando eu a dedicar-me a ele.

Para além disso tenho sido convidada para participar em algumas acções de formação e colóquios, que é uma coisa que gosto muito e continuo a ser a coordenadora da escolinha de futsal da casa do Benfica de Sesimbra onde dou aulas ao Sábado.

Mas segundo sabemos já está também a trabalhar com jogadores masculinos, no Fonsecas e Calçada.

Sim, isto tem tudo a ver com os serviços que a academia oferece. Este projecto da academia é novo em Portugal, nós temos «personal training» de futsal e futebol, isto está relacionado com atletas que querem melhorar a parte técnica, ou táctica e os próprios clubes onde os treinadores têm alguma dificuldade subscrevem estes serviços. Estou a ajudar a equipa feminina do Fonsecas e Calçada e também os seniores masculinos uma vez por semana, é uma equipa nova com miúdos que querem evoluir e é nisso que eu os estou a ajudar.

Podemos dizer que o seu objectivo imediato passa pelo futsal masculino?

Sim, tenho pensado nisso muito seriamente. Quando as pessoas souberam que eu já não estava no Benfica, recebi vários convites. O primeiro foi para ir para Itália e a seguir dois convites para treinar equipas masculinas. Achei em todas as ocasiões que não era a altura certa, mas neste momento já passaram dois meses e tenho a certeza que o que eu quero passa pelo masculino. O meu objectivo é aprender mais, ir mais longe e o masculino é capaz de me dar um diferente know-how que é o que preciso em termos da minha carreira e do meu curriculum.

Mas caso apareça um projecto dentro do futsal masculino certamente não será de imediato num clube com as aspirações do Benfica. Está preparada para um futuro sem tantos títulos?

Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Quando comecei a minha carreira como treinadora durante 7 anos não ganhei nada, a partir daí as coisas começaram a acontecer de forma regular, em 5 anos consegui ser campeã distrital de Lisboa pelo Benfica e em juniores pelos Novos Talentos. Tudo tem a sua hora, os títulos fazem parte, mas há coisa muito mais importantes.

É inevitável fazer esta pergunta, o que se passou para a sua saída do Benfica?

Não se  passou nada, eu estive no Benfica 5 anos, peguei na equipa quando ninguém queria, quando toda a gente recusou. Tive a coragem de pegar numa equipa com 3 jogadoras, fui buscar mais para nos mantermos na primeira divisão. Tive momentos muito bons no Benfica, mas depois de tirar o nível 3 achei que queria mais... As rotinas, já não me faziam correr. O Benfica foi uma experiência fantástica, já ganhava títulos antes de ir para lá, mas no Benfica a projecção é imediata.

Achei também que as jogadoras precisavam de outro treinador, fico feliz por ter deixado uma equipa no Benfica e feliz também por deixar a funcionar o escalão júnior e por isso olho para trás e sinto-me realizada pelos 4 títulos em 5 anos e o trabalho que foi cumprido.

Como reagiram as jogadoras à sua saída?

Eu não comuniquei directamente às jogadoras, o Benfica é um clube muito grande, com os seus procedimentos próprios e por isso eu dei conhecimento da minha decisão a quem de direito. Sei que houve algumas jogadoras que ficaram tristes, todas elas ficaram surpreendidas, mas era uma decisão que eu já estava a pensar há algum tempo.

Chegou-me aos ouvidos que algumas ficaram tristes, mas é como tudo na vida. Não sou treinadora de ficar agarrada a um clube para o resto da vida, o meu papel é que o Futsal Feminino vá para a frente e só me falta ser a primeira mulher profissional de futsal

Depreendemos das suas palavras que o futal feminino não passa pelo seu futuro imediato.


Muito honestamente, olhando para o estado do futsal feminino, com equipas a ganhar por 50-0, um campeonato a decidir-se cada vez mais entre Benfica e Lombos acho muito difícil que eu regresse ao futsal feminino. Olho para trás e em 5 anos pouco ou nada mudou. Fizemos uma acção de formação através da associação nacional de treinadores e as pessoas mais interessadas não apareceram. Temos 30 treinadores em Lisboa e apenas 2 estiveram presentes.

As pessoas estão mais preocupadas em mandar bocas em blogs e depois quando devem estar presentes não estão.

O que espera que aconteça num futuro próximo?

Sempre fui uma pessoa que guarda uma esperança de mudança. Felizmente existem algumas pessoas que lutam para que as coisas melhorem, mas essas pessoas não são suficientes. Os treinadores têm de se juntar, basta de olhar para os nossos quintais e se continuarmos assim há clubes que vão se perder.

In: FutsalPortugal.net