Decifrando imagens do passado

RedVC

#510
Citação de: Rodolfo Dias em 08 de Outubro de 2016, 17:06
Bom, comecemos por partes:
Citação de: RedVC em 08 de Outubro de 2016, 12:44
Por falar nisso esse emblema melhorado do Sport Lisboa fui eu que a "amanhei" a partir de outros dois tendo depois aprimorado com umas colorações de acordo com as sugestões de Alberto Miguéns. Mas bom, bom era que um designer gráfico fizesse uma coisa bem feita.
Descobri hoje este tópico, que parece ter aquilo que referes - só falta mesmo as cores como as que colocaste naquela versão (kudos, btw!)

Citação de: RedVC em 08 de Outubro de 2016, 14:48
O primeiro equipamento alternativo do SL Benfica foi...




o que está à esquerda!

Os detalhes foram contados por Alberto Miguéns e envolveram um jogo na década de 30 (talvez 1934) penso que contra o Sparta de Praga. Como os Checos jogavam com as nossas cores teve que se improvisar.  O que havia disponível era o equipamento do SC Império. Amarelo e negro. Às riscas!!!

Vou ver se encontro o artigo de A. Miguéns.
De facto sempre que cá venho aprendo mais qualquer coisa, e hoje não foi excepção. A história de como o Benfica, o anfitrião, teve de jogar com os equipamentos do dono do campo é só mais um reflexo de como se desenrolava o futebol nessa longínqua era, amador e cheio de "fair-play".  O0

Fair-play Rodolfo? Por vezes sim mas infelizmente não era a norma.

As coisas foram relativamente civilizadas até 1908-1909. A primeira verdadeira rivalidade do nosso futebol foi o SLB vs CIF. Os jogos eram intensos mas essencialmente as disputas eram dentro do campo. Do lado do CIF tínhamos homens como os irmãos Pinto Basto e Carlos Villar. Gente elevada que estava no desporto pelo desporto. O Benfica tinha também gente da estatura de Cosme Damião e Félix Bermudes.

Com o aparecimento do SCP e com o eclipse competitivo (por opção própria) do CIF tudo mudou.

Talvez antes tenham acontecido problemas mas seguramente no campeonato de 1910/1911 aconteceram factos graves que marcaram para sempre o clima entre os dois eternos rivais.

Nesse ano o campeonato foi quente e o campeão foi o CIF. No dia 18 de Junho de 1911 (se não estou em erro) o Benfica foi jogar ao campo do SCP (Sítio das Mouras) num jogo que não definia nada (o Benfica seria 2º e o SCP 3º). Apesar disso o clima foi explosivo e quando Eduardo Luís Pinto Basto, árbitro do CIF valida o golo de empate do SLB, deu-se uma enorme contestação do público. Invasão de campo e jogo interrompido primeiro e terminado depois.

A Liga Portuguesa de Futebol (entidade que pretendia reger o futebol) marcou um novo jogo mas o SCP apesar de jogar em casa não compareceu alegando que os jogadores do SLB não eram dignos de comparecer nas suas instalações. Alegavam que tinha havido agressão ao seu guarda-redes e que só isso tinha originado o golo de empate no jogo interrompido. Também nos jornal O Século um colunista com pseudónimo "Má fama" (que ao que parece seria irmão de um jogador verde) escreveu diversas adjectivações degradantes ao SLB. A resposta de Félix Bermudes e Cosme Damião fez notar que o nível desse senhor era igual ao dos "faquistas" que interromperam o jogo.

Ou seja fazendo um resumo, aconteceu:

● um jogo interrompido por invasão de campo nas instalações do SCP

● um jogo interrompido com gente verde com navalhas na mão

● uma campanha orquestrada num jornal contra o SLB

● uma recusa dos verdes em aceitar decisões da autoridade que superintendia o futebol

● uma série de acusações contaminadas com o tradicional sentimento de superioridade social e moral dos verdes em relação ao SLB.

Será que isto soa familiar? Há 105 anos atrás.

Note-se que no SLB não havia anjos. No SLB houve também excessos e inclusivamente há uma fotografia que denota uma agressão a um árbitro no decurso de um jogo contra o CIF (eventualmente nesse mesmo ano). Ainda assim o histórico do SCP nos primeiros anos foi de recorrentes desistências, episódios anti-desportivos e adjectivações baixas. Apenas em 1914/1915 e depois de diversos jogadores roubados ao SLB o SCP conseguiria o primeiro título.

Não, ainda antes desses tempos (1934) já havia muita coisa negativa. Em 1910/1911 já o palco estava montado. Os palhaços renovam-se mas a conversa é sempre a mesma. Já não há viscondes de Alvalade mas ainda há muito banqueiro a sustentar essa gente.



Bakero

RedVC, duas curiosidades saídas de uma conversa que estava a ter há pouco com um amigo, e tu és capaz de saber:

Como começou a alcunha de "lampião"? A ideia que eu tenho é que surgirá do Benfica ter sido o primeiro clube a ter iluminação artificial na península ibérica e os rivais (principalmente os do Sporting, claro) começaram a chamar os benfiquistas de lampiões. Confirma-se? Ou terá a ver com o Estádio da "Luz"?

E a expressão "glorioso" associada ao Benfica, tens ideia quando terá começado a ser utilizada?

Ps: E já agora mais uma lol. Há um pequena tradição no Benfica que eu sempre adorei, porque foi das primeiras coisas que me fascinou em criança quando ia ao antigo estádio da Luz: ver a equipa do Benfica a fazer a famosa vénia aos adeptos ao majestoso 3º anel (que infelizmente foi interrompida durante uns anos - finais de 90/início de 2000 parece-me - até que explicaram isso ao Simão e ele reactivou essa tradição que ainda hoje é cumprida). Tens ideia também qual foi a primeira equipa do Benfica a começar isso de fazer a vénia?

RedVC

#512
Citação de: Bakero em 11 de Outubro de 2016, 21:39
RedVC, duas curiosidades saídas de uma conversa que estava a ter há pouco com um amigo, e tu és capaz de saber:

Como começou a alcunha de "lampião"? A ideia que eu tenho é que surgirá do Benfica ter sido o primeiro clube a ter iluminação artificial na península ibérica e os rivais (principalmente os do Sporting, claro) começaram a chamar os benfiquistas de lampiões. Confirma-se? Ou terá a ver com o Estádio da "Luz"?

E a expressão "glorioso" associada ao Benfica, tens ideia quando terá começado a ser utilizada?

Ps: E já agora mais uma lol. Há um pequena tradição no Benfica que eu sempre adorei, porque foi das primeiras coisas que me fascinou em criança quando ia ao antigo estádio da Luz: ver a equipa do Benfica a fazer a famosa vénia aos adeptos ao majestoso 3º anel (que infelizmente foi interrompida durante uns anos - finais de 90/início de 2000 parece-me - até que explicaram isso ao Simão e ele reactivou essa tradição que ainda hoje é cumprida). Tens ideia também qual foi a primeira equipa do Benfica a começar isso de fazer a vénia?


Não sou assim tão sabedor mas posso apresentar o que sei. Vamos por partes:

Vénia:



remonta ao pós-digressão a Osaka 1970. Alberto Miguéns explica isso muito bem:

http://em-defesa-do-benfica.blogspot.com/2016/08/a-venia.html?m=1




Lampião
Diz-se que terá sido por volta de 1954 aquando da inauguração do Estádio. Nesse tempo grande parte das ruas de Lisboa ainda era iluminada com lampiões a azeite. E assim os sapos que estavam habituados a ver-nos com um estádio fraco quando olhavam para aquele lindo Estádio tentavam provocar-nos dizendo que a Luz só brilharia enquanto houvesse azeite...


Glorioso
Não sei exactamente quando mas penso ser mesmo dos primórdios. Aliás num V&P Alberto Miguéns falava que o termo usado era Gloriosíssimo. Isto a propósito das vitórias contra os Ingleses do Carcavellos Club (em particular a de 1910). Tanto quanto sei exceptuando as equipas de Casapianos de 1892 e 1893 (muitos dos quais foram depois jogadores da nossa primeira categoria) só o nosso Clube ganhou aos mestres Ingleses (pelo menos 3 vezes). O SCP e o CIF o melhor que conseguiram foram uns (um ou dois) empates!

Se souber alguma coisa que corrija estas ideias depois coloco aqui.



Bakero

Obrigado pelas tuas respostas. Fui ler o artigo do Miguéns e jesus, estou apaixonado por esta foto:



Isto é tão Benfica!  :bow2:

RedVC

#514
Citação de: Bakero em 11 de Outubro de 2016, 22:23
Obrigado pelas tuas respostas. Fui ler o artigo do Miguéns e jesus, estou apaixonado por esta foto:



Isto é tão Benfica!  :bow2:


Sim é verdade. Sempre o reconhecimento à grande força do Benfica! O adepto!


Há uma outra versão e se calhar mais perto da verdade histórica para o nome "lampião".

A fonte é também Alberto Miguéns que apurou isto junto de Benfiquistas antigos:

os sapos chamariam-nos lampiões dado que nos funerais antigos quem ia à frente levava dois círios (velas enormes) a arder. Acontece que os círios teriam um invólucro avermelhado e popularmente eram conhecidos por lampiões...

Sacanas dos sapos!

zappendrix



Borges Coutinho, António Fidalgo e Jaime Graça, em 1972, a embarcarem no aeroporto para mais uma eliminatória da Taça dos Campeões Europeus do Benfica.

zappendrix



António Fidalgo com Alberto e Gomes. Ao fundo, Nené e Rodolfo.

Porto-BENFICA, 1978.

Dandy






   "zappendrix":

   Sabes que existem fotografias onde não consta o António Fidalgo?

    :amigo:




zappendrix

Citação de: Dandy em 20 de Outubro de 2016, 13:13

:) O homem merece ser referenciado! Teve de competir na baliza do Benfica com o Bento e o José Henrique!



   "zappendrix":

   Sabes que existem fotografias onde não consta o António Fidalgo?

    :amigo:





zappendrix

Citação de: Dandy em 20 de Outubro de 2016, 13:13





   "zappendrix":

   Sabes que existem fotografias onde não consta o António Fidalgo?

    :amigo:

:) O homem merece ser referenciado! Teve de competir na baliza do Benfica com o Bento e o José Henrique!  :amigo:




RedVC

#520
Citação de: zappendrix em 21 de Outubro de 2016, 12:33
Citação de: Dandy em 20 de Outubro de 2016, 13:13





   "zappendrix":

   Sabes que existem fotografias onde não consta o António Fidalgo?

    :amigo:

:) O homem merece ser referenciado! Teve de competir na baliza do Benfica com o Bento e o José Henrique!  :amigo:




zappahendrix,
apesar de tudo há algum elemento nessa fotografias que tenha algum tipo de dificuldade de interpretação?
Talvez existam tópicos mais adequados para colocar essas fotografias. Que aliás agradeço porque nem conhecia. Este tópico talvez seja mais adequado para fotografias que sejam de difícil interpretação. Ainda hoje devo colocar por aqui uma mensagem que talvez demonstre bem a natureza do que estou a dizer.


RedVC

#521
-131-
Mobilis in mobile

1918, Doca do Bom Sucesso, Belém.

Na torre do submersível NRP Golfinho, 9 militares da Marinha de Guerra Portuguesa posam para o grande fotógrafo Joshua Benoliel (https://pt-pt.facebook.com/joshuabenoliel/). Entre esses bravos pioneiros da divisão de submersíveis da Armada Portuguesa nota-se que um envergava uma farda branca:


O NRP Golfinho fundeado na doca do Bom Sucesso em Belém. Na ponte estão nove homens.
Fonte: AML; fotografia de Joshua Benoliel.


É justamente nesse homem que hoje centraremos as nossas atenções. Um homem natural de Belém e alguém de quem já por aqui falamos, mas que nunca nos cessa de surpreender, de tão rica foi a sua vida.



Francisco dos Reis Gonçalves,
fundador do Sport Lisboa e pioneiro da Divisão de submersíveis da Marinha de Guerra Portuguesa.
Fonte: AML e Arquivo da Marinha Portuguesa.


Francisco dos Reis Gonçalves foi um Oficial Engenheiro Maquinista Naval com especialização em submersíveis. Mas para nós Benfiquista, a sua imortalidade ficou garantida por ter sido um dos 24 homens que fundou o nosso Clube no dia 28 de Fevereiro de 1904 na Farmácia Franco em Belém. Francisco foi um dos 24 Primeiros!


A aventura dos submersíveis em Portugal

Não há submersível como o primeiro...

Encomendado ainda em 1907, durante o reinado de D. Carlos I, o NRP Espadarte foi construído nos estaleiros La Spezia em Itália, tendo sido o primeiro vaso de guerra submersível da Marinha de Guerra Portuguesa. Nesses tempos pioneiros, Francisco dos Reis Gonçalves fez parte de um pequeno grupo de bravos marinheiros que adquiriu formação especializada e fez as primeiras experiências no estuário do Tejo e na costa Portuguesa.



O famoso "NPR Espadarte", o primeiro submersível da Marinha Portuguesa retratado no dia (festivo) 5 de Agosto de 1913. Estaria Reis Gonçalves a bordo do navio?


Produzido nos estaleiros da Fiat em San Giorgio, La Spezia, localidade perto de Turim, o NRP Espadarte foi lançado ao mar em 10 de Maio de 1912. Na sua viagem inaugural, partiu de La Spezia a 22 de Maio de 1913 tendo chegado a Lisboa a 5 de Agosto, data em que foi incorporado na Armada de Guerra Portuguesa. A Cinemateca Portuguesa tem algumas imagens extraordinárias do NRP Espadarte:



O sucesso das primeiras experiências na costa Portuguesa levou o Governo Português, no final de 1915, a encomendar aos mesmos estaleiros Italianos, três novas unidades, um pouco mais modernas. A Marinha de Guerra Portuguesa tornava-se uma das primeiras do Mundo a constituir uma frota de submarinos.



Fonte: Ilustração Portuguesa.


Os três novos submersíveis NRP Foca, NRP Golfinho e NRP Hidra, designados em Portugal como submersíveis da classe "Foca", foram finalmente lançados à água em Dezembro 1917. Ficaram portanto operacionais ainda em tempo de Guerra tendo desempenhado missões enquadradas no esforço de Guerra contra a Alemanha. Durante esse conflito, Portugal contribuiu para a aplicação de restrições comerciais e de segurança ao inimigo Alemão, efectuando um bloqueio naval de superfície. Entre essas missões estiveram o patrulhamento de costa e de alto-mar e escoltas de transporte de tropas e de mercadorias para África ou para a Europa. Os quatro submersíveis foram uma peça importante para esse esforço de guerra. Até ao final da guerra, a base operacional da Esquadrilha ficou instalada na Doca do Bom Sucesso em Belém. Francisco dos Reis Gonçalves, um filho de Belém, esteve também envolvido nessa aventura marítima.


Esses quatro submersíveis apesar de hoje serem considerados primitivos tinham uma grande fiabilidade e estavam muito bem adaptados para essas missões costeiras. Navios idênticos foram usados na Grande Guerra obviamente pela marinha Italiana mas também pelas Marinha de Guerra de Portugal, Brasil, Espanha, Suécia e Rússia. Eram máquinas de 45m, totalmente manuais, dotadas de TSF embora com limitações tremendas relativamente às características básicas dos modernos submersíveis.



Perfil dos NRP Espadarte e do NRP Foca, dois dos primeiros quatro submersíveis da Marinha de Guerra Portuguesa. Tabela com as características técnicas básicas dos quatro vasos de guerra que constituíram a primeiras frota de Guerra submarina Portuguesa. Fonte: blogue Momentos de História; http://www.momentosdehistoria.com/001-grande_guerra/001-01-marinha/001-01-05-marinha_guerra/001-01-05-04-submarinos.html.


E foi neste quadro de guerra que se deu a atribulada chegada dos três novos submersíveis a Portugal. Sobre as ordens do Comandante Joaquim de Almeida Henriques, três tripulações nas quais se incluía Francisco dos Reis Gonçalves, viveram uma aventurosa e arriscada viagem inaugural. Mas para Reis Gonçalves, esta missão começou umas semanas antes, uma vez que esteve em La Spezia como agente nomeado pela Marinha de Guerra Portuguesa para a fiscalização da construção dos referidos vasos de guerra.

E assim em 15 de Dezembro de 1917, escoltados pelo navio de salvamento NRP Patrão Lopes, os três novos submersíveis largaram do porto de La Spezia e cruzaram o Mediterrâneo em direcção a Lisboa.


O NRP Patrão Lopes. Fonte: Momentos de História.


A atribulada viagem fez-se em 8 etapas que decorreram em condições climatéricas muito difíceis e em pleno conflito mundial. O perigo de recontros com submarinos inimigos era real e aliás durante a viagem, a frota Portuguesa terá testemunhado o afundamento de diversos navios aliados por parte dos U-boot, os formidáveis submersíveis Alemães. Felizmente, após a longa viagem, a frota Portuguesa viria a ter apenas como maiores contratempos algumas avarias que foram entretanto reparadas em alguns portos que visitaram entre essas etapas. Finalmente, depois dessas peripécias, a frota chegou a Lisboa em 10 de Fevereiro de 1918, entrando ao serviço efectivo da Marinha Portuguesa.



Os três submersíveis da classe "Foca", NPR Hidra, NPR Golfinho e NPR Foca fundeados no estuário do Tejo, perto da sua base na Doca do Bom Sucesso em Belém. Fotografia provavelmente de 1918. Fonte: AML.


Como nos refere o Senhor Carlos Alves Lopes no blogue Momentos de História (http://www.momentosdehistoria.com/001-grande_guerra/001-01-marinha/001-01-05-marinha_guerra/001-01-05-04-submarinos.html): "A operacionalidade da 1ª Esquadrilha foi notável, houve um esforço humano e material que levou à utilização do NRP Espadarte até ao limite da sua capacidade mecânica, em Agosto de 1918, e à constante utilização das restantes três unidades até ao final do conflito."

Os comandos da 1ª Esquadrilha de Submarinos foram assim distribuídos: NRP Golfinho, Capitão-tenente Joaquim Almeida Henriques; NRP Foca 1º Tenente Adalberto da Silva Machado; NRP Hidra, 1º Tenente Fernando Augusto Branco e finalmente NRP Espadarte, 2º Tenente Fernando Alves de Sousa. Em cada navio, estes homens lideravam um corpo de 2 outros oficiais e de 18 marinheiros. Os nove homens registados na ponte do Golfinho eram parte do corpo de oficiais pioneiros desse ramo da Armada de Guerra de Portugal, tendo por isso tido a honra de serem imortalizados por Joshua Benoliel. 



Os quatro comandantes dos submersíveis Portugueses em 1918. Fonte: Arquivo da Marinha Portuguesa.


Pelo registo militar, o Engenheiro Maquinista Francisco dos Reis Gonçalves, com a patente de 2º (depois 1º) Tenente, terá prestado serviços em pelo menos três desses quatro vasos de guerra. Era um dos três oficiais dos submersíveis em que prestou missões. Sabe-se que a sua instrução foi feita no NRP Espadarte (concluída em 1915), tendo depois prestado missões no NRP Foca (cerca de 5 anos, de 1917 a 1922) e finalmente no NRP Golfinho (alguns meses em 1922). Desconheço se chegou a servir no NRP Hidra. Durante os 5-6 anos seguintes, Francisco dos Reis Gonçalves fez parte da divisão de Submersíveis da Marinha Portuguesa.


Parte do Livro de registo da vida militar de Francisco Reis Gonçalves. Fonte: Arquivo da Marinha Portuguesa.


Numa verdadeira viagem ao passado, temos hoje a felicidade de poder ver um filme onde os serviços da Armada Portuguesa registaram esses magníficos submersíveis:

https://youtu.be/AT5XP3-SNwo
Os NRP Espadarte, NRP Hidra, NRP Golfinho e NRPFoca a navegar no Tejo

Interessa-nos em particular o submersível NRP Foca (o que tem um "F"" branco) onde Francisco Reis Gonçalves prestou a maior parte do seu serviço militar em submersíveis.


1 - O submersível NRP Espadarte na doca Bom Sucesso com o Mosteiro dos Jerónimos como painel de fundo; 2- A casa de torpedos do NRP Hidra; 3 – Compartimento do periscópio do NRP-Hidra; 4 – o NRP Hidra navegando à superfície com parte da sua tripulação a observa um hidroavião. Fonte: http://osrikinhus.blogspot.pt/.


Uma vida militar intensa

Mais haveria para dizer, mas para não ser maçudo e para dar o máximo de informação, fica aqui uma detalhada (mas não completa) cronologia da sua intensa vida militar:

Angola, 1909; Belém 1910;

   • 1909, cumpriu missão na Estação Naval de Angola;

   • 1910, Janeiro, regressou a Portugal continental;

   • 1910, teve licença superior para casar com Elvira da Conceiçao Ferreira de Almeida;

   • 1910, Setembro recebeu guia para uma missão na Canhoneira Limpopo;


Majoria general, adjunto, Belém, 1911-1913;

   • 1911, Julho, recebeu guias para o cruzador Vasco da Gama e depois para o cruzador S. Rafael;

   • 1911, Novembro regressou ao "Vasco da Gama";

   • 1912, destacado na canhoneira "Diu" em missão na Estação Naval de Moçambique;


Moçambique e Divisão das Construções Navais, Belém, 1913-1914;

   • 1913, início do ano, regresso a Moçambique;

   • 1913, destacado para o navio Almirante Reis antigo D. Carlos I;

   • 1914, Janeiro, guia para o formidável cruzador Adamastor;

   • 1915, fez instrução em navegação submarina, cumprindo 21 missões de imersão no submergível Espadarte;

   • 1915, a 24 de Novembro completou a instrução sendo declarado "Especializado em navegação submarina";


Direcção Geral da Marinha, 1916;

   • 1916, Março, missão oficial incumbida de fiscalizar em Turim a construção dos três submersíveis;

   • 1916, Março, destacado para o submergível Espadarte;

   • 1916, a 25 de Novembro é promovido a 2º Tenente Maquinista;


Belém e Estaleiros La Spezia, Itália (onde foram construídos os 3 submersíveis da classe "Foca"), 1917;

   • 1917-1928, instrutor na esquadrilha de submersíveis;

   • 1917-1922, cumpriu missões no submergível "Foca" de 20-10-1917 a 31-01-1922;

   • 1918, a 29 de Julho é promovido a 1º Tenente Engenheiro Maquinista;

   • 1919, nomeado para permanência em zonas de Guerra;

   • 1922, cumpriu missões no submergível "Golfinho", de 31-01-1922 até 1-05-1922;


Estação de Terra de Submersíveis, Belém, 1922-1923;

   • 1923, Maio cessa a sua missão na Estação de Terra de Submersíveis;

   • 1923, assumiu o comando interino da esquadra de submersíveis. Revelou proficiência e dedicação que levaram ao bem-sucedido trabalho de reparação dos motores do Golfinho (daí o seu destacamento por 4 meses para essa unidade de guerra). Esta distinção deve ter tido a ver com uma explosão que ocorreu no dito vaso de guerra;

Recebeu diversas medalhas de prata de comportamento exemplar e bons serviços. Foi também louvado por diversas vezes por aptidão e valor militar. Nessas honrarias militares foi destacado não só a sua valorosa participação nas missões de patrulhamento da costa Portuguesa em tempo de Guerra mas também daquela viagem dos submersíveis que no Inverno de 1917, fizeram a rota de Itália (dos estaleiros de La Spezia onde foram construídos) para Belém.


   • 1923, a 5 de Outubro recebeu o grau de oficial da Ordem de Avis;

   • 1925, a 3 de Setembro cessou a sua participação na esquadrilha de submersíveis da classe Foca: Golfinho e Hidra; o primeiro em missões no Sul e o segundo no Norte da costa de Portugal. Nesses longos períodos fora da base foi-lhe reconhecido grande responsabilidade e competência. O seu comportamento, zelo e esforço foi louvado por diversos outros oficiais;

   • 1931-1932, missão naval em Génova, Itália;

   • 1932, medalha de prata de Filantropia e caridade pela sua acção no Instituto de Socorros a Náufragos;
   
   • 1932, missão no contratorpedeiro Tâmega;

   • 1932, instrutor de motores na Brigada de Mecânicos;

   • 1936, missão a bordo do aviso de 1ª classe Afonso de Albuquerque e do contra-torpedeiro Dão. Recebeu um louvor do comandante do Afonso de Albuquerque pela sua acção como chefe do Serviço de Máquinas;

   • 1936, medalha militar de ouro da classe de comportamento exemplar;

   • 1938-1940, instrutor na Escola da Marinha na disciplina de Geradores e Máquinas a vapor;

   • 1939, 1 Fevereiro, promovido a 2º Capitão Tenente Engenheiro Maquinista Naval,

   • 1940, a 21 de Dezembro passou para a Reserva da Armada com efeitos de 30-12-1939;
   
   • 1944, nomeado para Conselho de Promoções de Oficiais da Armada;

   • 1946, 24 Abril, promovido ao posto de Capitão-de-fragata Engenheiro Maquinista Naval;

   • 1946, pedido licença para se ausentar em Inglaterra;

   • 1946, no final desse ano atingiu o limite de idade;

   • 1955, faleceu em Lisboa no dia 27-08-1955.



Ficam ainda alguns registos fotográficos dos navios por onde Francisco dos Reis Gonçalves fez a sua brilhante e corajosa vida profissional militar.



Alguns dos diversos navios da Marinha Portuguesa por onde Francisco dos Reis Gonçalves prestou missões. Fonte: http://osrikinhus.blogspot.pt/.




Outros dos diversos navios da Marinha Portuguesa por onde Francisco dos Reis Gonçalves prestou missões. Fonte: http://osrikinhus.blogspot.pt/.



Mobilis in mobile.

Em tudo o que atrás se disse, se mostrou que Francisco dos Reis Gonçalves, Engenheiro Maquinista Naval com especialização em submersíveis, foi um homem de notáveis realizações. Foi um pioneiro em diversos sectores. Pioneiro do Glorioso, pioneiro no fundamental e prestigiante esforço de guerra submarina Portuguesa, na qual foi um elemento corajoso e competente.

Foi um filho de Belém e assim se compreende que tendo o nosso Clube perdido a ligação ao bairro de Belém, Francisco se tenha progressivamente desligado do SLB. Talvez não seja muito conhecido mas nos primeiros anos após a fusão SL-GSB, Francisco liderou uma delegação do SLB no bairro de Belém. Essa sede estava sediada na hoje desaparecida Praça Vasco da Gama, bem perto do Mosteiro dos Jerónimos. Essa praça já não existe, tendo sido arrasada aquando da Exposição do Mundo Português em 1940. Nessa nova estruturação do Clube, idealizado por Cosme Damião, o SLB pretendia ser um Clube sediado no centro de Lisboa com sedes em Benfica e em Belém, os dois berços do nosso Clube.

Mas o bairrismo das gentes de Belém falou mais alto. A filial do Sport Lisboa e Benfica definhou e acabou por ser fechada. Iam longe os tempos das Salésias e tinha sido perdida a identificação com o Clube. Francisco Reis Gonçalves desligou-se mas voltaria ao dirigismo no futebol na década seguinte quando ajudou a concretizar o sonho de Artur José Pereira, em se fundar um novo grande clube em Belém. Assim nasceu o Clube de Futebol "os Belenenses".

Francisco foi juntamente com outros antigos Benfiquistas Virgílio Paula e Luís Vieira, um dos homens de e com prestígio em Belém, que deram solidez estrutural ao novo Clube. Se a componente desportiva inicial foi dada por futebolistas em fim de carreira como Artur José Pereira, Henrique Santos, Francisco Pereira, Romualdo Bogalho, Aníbal Santos, Manuel Veloso, Carlos Sobral, Alberto Rio entre outros, a componente institucional e burocrática foi assegurada por outros homens entre os quais se destacou Reis Gonçalves.

E essa foi a contribuição final de Francisco no futebol nacional. Logo após da fundação do CFB, Francisco assumiu a presidência da Junta Directiva entretanto formada. Seria depois Presidente da Direcção entre 1920 e 1922 e manteve-se sempre como figura influente do clube de Belém. Mais tarde foi ainda Presidente da Assembleia-Geral do CFB (entre 1934 e 1948 e entre 1950 e 1955) tendo finalizado a sua participação no dirigismo do futebol nacional quando assumiu a presidência da Associação de Futebol de Lisboa - AFL (entre 1924 e 1926).



Reunião dos presidentes da AFL em 1951. Francisco dos Reis Gonçalves é o último sentado à direita.



Fonte: DL, 28 Agosto 1955


Bakero

Ver videos de 1913 é de deixar uma pessoa  :o :o :o

Obrigado por mais uma interessantíssima leitura  O0

RedVC

Obrigado Bakero  O0

Estes cruzamentos entre o SLB e a História de Portugal são interessantes. Aprendemos duplamente.

paalexg

Citação de: RedVC em 11 de Outubro de 2016, 23:20
Citação de: Bakero em 11 de Outubro de 2016, 22:23
Obrigado pelas tuas respostas. Fui ler o artigo do Miguéns e jesus, estou apaixonado por esta foto:



Isto é tão Benfica!  :bow2:


Sim é verdade. Sempre o reconhecimento à grande força do Benfica! O adepto!


Há uma outra versão e se calhar mais perto da verdade histórica para o nome "lampião".

A fonte é também Alberto Miguéns que apurou isto junto de Benfiquistas antigos:

os sapos chamariam-nos lampiões dado que nos funerais antigos quem ia à frente levava dois círios (velas enormes) a arder. Acontece que os círios teriam um invólucro avermelhado e popularmente eram conhecidos por lampiões...

Sacanas dos sapos!
Foi essa a versão que eu sempre ouvi (e a que vem no Vitórias & Património sobre a rivalidade Benfica-SCP).

Que os benfiquistas eram de tão baixa condição que, durante os funerais, levavam os lampiões.