(actualizado) Memorial Benfica, Glórias

ednilson

Ricardo Gomes Raimundo. Rio de Janeiro, Brasil. 13 de Dezembro de 1964. Defesa.
Épocas no Benfica: 4 (88/91 e 95/96). Jogos: 140. Golos: 27. Títulos: 2 (Campeonato Nacional), 1 (Taça de Portugal) e 1 (Supertaça).
Outros clubes: Fluminense e Paris SG. Internacionalizações: Brasil.




Equipa 1990/1991

Sustentam os especialistas da coisa redonda que uma equipa deve ser edificada de trás para a frente. Um conceito que encerra já muito de modernidade. No Benfica, perante esse exercício, que de retórica não é, saltam logo à memória os nomes de Félix, de Germano, de Humberto Coelho. Também de Mozer, de Aldair, de Gamarra. E forçosamente, de Ricardo Gomes, o primeiro jogador que, não tendo chegado ao mundo em Portugal ou nas colónias, a braçadeira de capitão envergaria. Líder congénito, impunha de forma espontânea a sua autoridade, sem levantar a voz, sem espalhafato, sem jactância. Sabia cofiar as hostes, pioneiro no exemplo. O exemplo de um defesa imbatível.

Após ter chegado à final da Taça dos Campeões de 87/88, o Benfica perdeu, no ano seguinte, Dito e Rui Águas, depois de uma vil tramóia, congeminada em gabinetes nortenhos. Lamentava-se Toni, então treinador, que lhe haviam dado "dois tiros no porta-aviões". Ferido o orgulho da águia, fria foi servida a vingança. Ricardo Gomes, pedra basilar do Fluminense e da selecção do Brasil, aterrava em Lisboa, rumo à vitória.



Debaixo se sol algarvio, abriu as hostilidades, pela primeira vez, frente ao Portimonense, na terceira ronda do Nacional, que o golo de Vata transformou em sucesso. Seguiu-se uma campanha quase sem mácula. O Benfica recuperaria o titulo nacional. Ricardo Gomes fez 31 jogos e apontou oito golos, quase todos decisivos, naqueles últimos minutos de assomo da onda vermelha. Com Mozer ao lado, no centro da defensiva, em 38 encontros, apenas 15 (!) bolas sofridas.

Desfeita a melhor dupla de sempre, recepcionou outro compatriota, também internacional, de seu nome Aldair. O Campeonato escapou, mas a presença na final dos Campeões (0-1), frente a um super-Milan, era sinal indicativo da vitalidade competitiva do clube. De resto, no ano seguinte, novo titulo nacional para o Benfica, com nove golos de Ricardo Gomes na prova.



Uma mala cheia de francos levou-a até à Cidade Luz, em representação do Paris Saint-Germain. Regressou em 95/96, 45 vezes internacional pelo escrete canarinho, sob o sábio e ternurento comando de Mário Wilson. No Jamor fez o aceno definitivo. Em glória.

Quatro épocas apenas jogou Ricardo Gomes no Glorioso. Só que mais pareceu uma eternidade, tão dominantes e sedutores foram os seus tempos. Agora, parece uma miragem. Assim se faz também o sortilégio do Benfica.

Pedro Saraiva

É a minha maior referência de sempre a nível de jogadores do Benfica (aqueles que vi jogar ao vivo).
Parecia que entrava já cansado para o aquecimento mas era daqueles que ainda não tinha sacado a bola ao adversário e já sabia o que iria fazer com ela.

Talvez um dia regresse.................como treiandor.
Sigo-o atentamente.

Ednilson............. :clap1:.......obrigado pelo fantástico post

ednilson

Rogério Apolónio de Sousa. Funchal. 18 de Abril de 1910-1976. Avançado.
Épocas no Benfica: 8 (32/40). Jogos: 161. Golos: 101. Títulos: 3 (Iª Liga), 1 (Campeonato de Portugal), 1 (Taça de Portugal) e 2 (Campeonato de Lisboa).
Outros clubes: Nacional da Madeira e Sporting.




Equipa 1939/1940 – Rogério Sousa ao centro, de pé.

No segundo quartel do século XX, pelo universo da bola indígena, Funchal era sinónimo de Pinga, esse primitivo milagre de que o FC Porto, à custa de algumas arteirices, se apropriou no arquipélago. Mas outro madeirense, por essa altura, também se lançou aventura dentro. Cortejado pelo Benfica, haveria de rumar a Lisboa. Era Rogério Sousa, avançado de posição, que teve uma permanência de oito temporadas no edifício vermelho.

Nasceu ainda no regime monárquico, mas hipótese não teve de dar conta. Estava com seis meses de vida, em 1910, quando a República foi implantada. Ainda garoto, fascinado pela bola de trapos, sinal da austeridade dos tempos, revelava queda para o oficio de futebolista. Caucinado pelo golo, mistela de criativo e finalizador parecia ser. E até sem as errâncias bem próprias da idade.

O Benfica, a partir de 1932, permitiu que vagueasse pelos afamados palcos da época. Era o elixir que faltava. Para dar cor à vontade. Rogério Sousa rejubilou e deu inicio à jornada. Logo na primeira época, ajudou a pôr termo ao interregno de 12 anos, com o clube a sagrar-se campeão de Lisboa, para gáudio do técnico Ribeiro dos Reis. Albino vendia segurança, Rogério oferecia desequilíbrio, Vítor Silva emprestava conclusão. Era muito assim aquele Benfica.

No total, conquistou três Campeonatos da I Liga, um Campeonato de Portugal, dois Campeonatos de Lisboa e uma Taça. Disputou 161 jogos, facturando 101 golos. Em 1936/37, ano em que se consagrou bicampeão, foi mesmo o melhor marcador da equipa, com 32 remates certeiros, apesar da presença já no plantel de Guilherme Espírito Santo e também de Xavier ou Valadas. Jogador mais vezes utilizado seria ainda. Com uma gerência técnica de cinco anos ininterruptos, o húngaro Lipo Hertzka terá sido o treinador que melhor soube optimizar os seus recursos. No papel de actor principal, do meio-campo para a frente, chegou a empolgar. Tinha o talento dos pensadores, a alma dos crentes, a energia dos combativos, a solidariedade dos simples.

Actuou pela derradeira vez em 16 de Junho de 1940, no triunfo (2-1) sobre o Carcavelinhos. Martins, Albino, Francisco Ferreira, Teixeira e Valadas, entre outros, testemunharam o último suspiro do madeirense. Dele, Rogério Sousa, um dos jogadores que mais relampaguearam no céu azul da felicidade vermelha.


ednilson

José Rosário. Porto. 15 de Agosto de 1924. Avançado.
Épocas no Benfica: 6 (48/54). Jogos: 98. Golos: 22. Títulos: 1 (Campeonato Nacional), 3 (Taça de Portugal) e 1 (Taça Latina).
Outros clubes: SL Cartaxo, SL Elvas e Atlético.




Equipa 1950/1951

Tempos houve no Benfica, aí por volta da transição das décadas de 40 e 50, em que a expressão, não são contas do teu rosário era mais ou menos interdita. É que por lá, por entre outros artistas, havia um tal de Rosário, José de nome próprio, mas sem Rosário, que problema não foi, antes, muitas vezes mesmo, solução para benfiquistas encantar.

Chegou ao clube na época 48/49, instalado ficou na sala de espera da Taça Latina. Não demorou a chamada. Um ano apenas. A Lázio de Roma sucumbiu àqueles 3-0, com Rosário nas abertura das hostilidades. Seguiu-se o Bordéus, primeiro um empate (3-3), mais finalíssima, até prolongamentos à mistura (2-1). Depois, depois foi a glória. O primeiro grande troféu internacional do clube, do futebol luso. Com sabor doce, tão doce, tão doce, que a nível interno o Sporting e os seus Violinos faziam miséria, encostando o Benfica à traseira. Ser o primeiro na Europa de expressão latina, a vingança, o gozo maior foi.

Rosário, diriam os brasileiros, pegou destaque. Flanqueador por vocação, driblava intuitivamente. Era preciso nas assistências, não enjeitava a finalização. Ombreou com alguns dos históricos da praça vermelha. Com Bastos, Félix, Fernandes, Jacinto, Francisco Ferreira, Moreira, Corona, Espírito Santo, Arsénio, Julinho, Rogério. Mais tarde, Águas, Artur Santos, Caiado, Palmeiro. Atingiu quase uma centena de jogos oficiais na categoria principal, com o empréstimo de 22 golos. Tudo reunido numa colecção onde cabem também, em lugar de primazia, um Campeonato Nacional e três Taças de Portugal.

A 10 de Junho de 1951, no Jamor, alinhou a extremo-esquerdo, frente à Académica. Deu goleada (5-1), com quatro golos do inimitável Rogério, uma espécie de papa-golos e papa-taças. Houve festival e, sobretudo, desforra. É que tinham sido os estudantes a ultrapassar o Benfica, na primeira edição da prova, 12 anos antes. Sobrevivente ao naufrágio, Francisco Ferreira exultou com o troféu entre mãos, feito também da massa do talento de Rosário. Um ano depois, cairia o arqui-rival Sporting, após 5-4, com Rogério a desperdiçar um penalti, mas presente no fecho da contagem, a um minuto do fim. Ainda hoje, chovem loas a esse jogo épico, também com a presença de Rosário.

Em 53/54, o abandono, já na casa dos 30 anos. Sem capa, sem batina, ante a Académica. Mas com orgulho de águia. Com o aplauso da plateia. O abraço dos companheiros. A reverência dos adversários. O elogio dos críticos. E o lugar na parada de honra.

ednilson

Rogério Lantres de Carvalho. Lisboa. 7 de Dezembro de 1922. Avançado.
Épocas no Benfica: 12 (42/54). Jogos: 310. Golos: 207. Títulos: 3 (Campeonato Nacional), 6 (Taça de Portugal) e 1 (Taça Latina).
Outros clubes: Chelas, Botafogo e Oriental. Internacionalizações: 15.




Equipa 1943/1944

Só tem menos 20 anos que o Benfica. Embeiçou pelo clube na infância, vestiu-lhe a camisola, deu-lhe glórias. Hoje, são recordações. Recordações de quem era conhecido por ter pés inteligentes, que faziam coisas incríveis com a bola. Espécie de antítese do jogador prosaico, cultivava a diferença. À custa de fintas prodigiosas, assistências perfeitas, finalizações requintadas. Era o Pipi, Rogério Pipi, elegante e aprumado, dentro... e fora do campo.

Nasceu em Chelas, a 7 de Dezembro de 1922, no mesmo ano em que da sua Lisboa partiu o hidroavião "Lusitânia" pilotado por Gago Coutinho e Sacadura Cabral, viajando entre Portugal e o Brasil. O pai havia sido fundador do Chelas, enquanto o irmão, Armindo França, um dos melhores atletas do clube, mais tarde Oriental, após se ter fundido com outra agremiação desportiva. Por isso, no Chelas começou a jogar, convivendo mal com o peso do parentesco, mesmo que reminiscente estivesse a paixão pueril pela bola.

Chegou ao 4º ano na Escola Afonso Domingues, que abandonou para trabalhar no Grémio das Carnes. Num jogo entre solteiros e casados, apitado por Fernando Peyroteo, deslumbrou de tal forma que o seu companheiro de profissão e mais tarde grande glória sportinguista o quis levar para o clube do Visconde de Alvalade. Ainda treinou no Sporting, mas o ambiente não o cativou, nem sequer a proposta de 25 notas para que de verde trajasse. Um conto de réis mais ofereceria o Benfica e o acordo acabou por ser selado.

Estreou-se com o Belenenses, nas Salésias, como extremo-direito. Mas foi sol de pouca dura, já que Janos Biri acabou por fixá-lo no lado canhoto. Ele que até preferia jogar como interior. "Teria sido melhor para mim e para o Benfica, decerto até com uma carreira mais prolongada". Que é como quem diz, menos sujeita às porradas de alguns ferrabrás, na altura proliferantes no posto de lateral-direito.

Tal como na literatura, também o futebol passou, nos anos 50, da fase romântica para um estádio de maior realismo. Seja como for, Rogério desceu os últimos degraus do "amor à camisola". E disso se ufana mesmo. "Por exemplo, em 1945, por nos sagrarmos campeões recebemos um prémio de 500 escudos. Pareceu-nos uma fortuna, porque, naquela altura, o ordenado mensal de um craque andava pelos mil escudos. Ninguém podia viver só do futebol. Eu jogava e trabalhava como Peyroteo no Grémio das Carnes. O Espírito Santo, o Jesus Correia e o Canário trabalhavam no Grémio das Mercearias". Era a fase agonizante do futebol romântico. Agonizante, mas bela.



A primeira época no Benfica foi inesquecível. Ao lado de alguns dos seus ídolos, daqueles cujos cromos saiam nos rebuçados, contraditoriamente, a menos de um tostão cada qual, casos de Albino, Gaspar Pinto e Francisco Ferreira, logo a equipa garantiu a primeira e histórica dobradinha, vencendo o Campeonato e a Taça de Portugal. Foi em 42/43. Dois anos volvidos, novo triunfo no Nacional.

Seguiu-se um período penoso para o colectivo benfiquista, consubstanciado numa longa abstinência. Um titulo para o Belenenses e três consecutivos para o Sporting perturbaram as hostes e apelaram à retoma. Foi nesse período, corria o ano de 1947, que Rogério viveu a sua primeira e única experiência internacional, coisa virgem na altura. Ingressou no Botafogo. "No Brasil recebia cerca de 18 contos por mês. Pude mesmo comprar um automóvel, no regresso, que era, então, o sonho de qualquer jogador de futebol". Não se deu bem, já casado e à espera de um rebento. Voltou ao Benfica, que o cacau não estava à cabeça das suas prioridades.

Na dobragem da década, deu-se a primeira afirmação internacional do clube da águia. A época de 49/50 fez regressar a equipa ao topo caseiro, com a vitória no Nacional, mas também conquistar a Taça Latina ao Bordéus (2-1, após dois prolongamentos). "Quando o jogo acabou ficou tudo... louco. Só sei que entre empurrões, voando sobre os ombros dos benfiquistas em grande histeria, cheguei à tribuna. O presidente da República pôs-me a taça nas mãos. Ainda hoje não consigo descrever o que senti". Talvez a pré-história do Benfica europeu.



Numa dúzia de anos vermelhos, Rogério foi 15 vezes internacional. Venceu três Campeonatos e seis Taças. Tinha, de resto, uma especial apetência para a prova-rainha do futebol indígena. Jogou e marcou em todas as finais. Ainda hoje, é o melhor a concretizar, mercê de 15 golos, alguns dos quais ainda lembrados pelo seu carácter decisório.

O maior jogador português do inicio dos anos 50 indemne tem passado ao longo dos anos. Mais que legenda é lenda. Que a nação benfiquista tem sabido proteger ou não se tratasse de alguém que inventou o futuro.

Kobille

Palavras para quê? É de uma pessoa ficar aqui algumas dezenas de minutos a ler isto. Especialmente pessoas como eu, jovens, que querem saber sempre mais e mais sobre o clube do coração. Parabéns e obrigado, ednilson!
O0

pcssousa

Este é sem qualquer sombra de dúvida o melhor tópico do fórum! Mas que tal criar um para outras figuras do Benfica que não os futebolistas? que tal um tópico para Carlos Lisboa, António Livramento, Alexandre Yokoshi, António Leitão, as célebres Marias do vólei, os penta-campeões europeus de estrada, Manuel Dias, Francisco Lázaro, Vasco Vasconcelos, ou mesmo antigos dirigentes como Cosme Damião (que nunca chegou a ser presidente)  ou Borges Coutinho?
Eu tenho bastante material recolhido e se quiserem posso colaborar ou mesmo começar a médio prazo com um tópico assim, isto se houver interesse por parte dos restantes foristas...

Red skin


ednilson

José Rui Lopes Águas. Lisboa. 28 de Abril de 1960. Avançado.
Épocas no Benfica: 7 (85/88 e 90/94). Jogos: 237. Golos: 104. Títulos: 3 (Campeonato Nacional) e 3 (Taça de Portugal).
Outros clubes: Cultural da Pontinha, Sporting, Sesimbra, Atlético, Portimonense, FC Porto, Reggiana e Estrela da Amadora. Internacionalizações: 31.




Equipa 1987/1988

Não é seguramente no futebol, pelo menos ao nível do alto rendimento, que o aforismo "filho de peixe sabe nadar" encontra maior espaço de afirmação. Já o mesmo nunca poderia dizer (ou talvez sentir) o malogrado José e o seu filho Rui, que, fazendo excepção à regra, transformaram a família Águas na mais emblemática do futebol luso. E com a vantagem adicional – inclua-se também o sobrinho/primo Raul, outro jogador do Benfica – de se revelar pródiga em comunicar no idioma predilecto dos fãs da causa da bola – o golo.

Rui cresceu com a imagem do pai a erguer a Taça dos Campeões. Daquelas que inspiram mais que um quadro de Picasso ou de outro dos imortais da tela. Por isso, aos 12 anos, era vê-lo nos infantis do Benfica. Foi assim durante duas épocas, seguindo-se o Cultural da Pontinha e o Sporting. Depois de uma pausa, com o voleibol a fazer em exclusivo as despesas da prática desportiva, Rui Águas, já sénior, defendeu as cores do Sesimbra, do Atlético e do Portimonense, ingressando no Benfica, aos 24 anos, corria a temporada de 84/85.



Ponta-de-lança nato, especialista no jogo aéreo, tinha mais intuição que escola. Mas tinha razão e coração. Mais ainda, tinha inteligência. O poder de salto e a execução técnica faziam o resto. E o resto eram golos, muitos golos. Um acervo deles. No total, fez 123 remates certeiros pelo Benfica, em 285 jogos, distribuídos por sete temporadas. Na época 90/91, sagrou-se mesmo o melhor marcador do Nacional. Conquistou três Campeonatos e outras tantas Taças de Portugal.

Durante dois anos (88/89 e 89/90) jogou no FC Porto, transferindo-se para o Norte, alegando que o Benfica "pagava mal". Em 31 ocasiões, vestiu a camisola das quinas, com o apreciável contributo de dez golos (seis pelo Benfica). Ainda disputou a final dos Campeões, em 87/88, frente ao PSV, mas não conseguiu imitar o italiano Paolo Maldini, vencedor do titulo europeu tal como o pai, Cesare Maldini, duas décadas atrás.



Abandonou o Benfica com o estatuto de campeão, no último grande triunfo da história centenária. Pese embora um número significativo de semelhanças, o mérito maior de Rui Águas foi libertar-se do estigma do pai, decerto o melhor cabeceador de sempre do futebol português. Ou talvez o mérito do Rui assentasse mesmo, donairosamente, em ter sido o filho do Águas que (também) sabia marcar.

ednilson

Rui Gouveia Rodrigues. Lourenço Marques, Moçambique. 17 de Maio de 1943. Defesa.
Épocas no Benfica: 3 (71/74). Jogos: 59. Golos: 2. Títulos: 2 (Campeonato Nacional).
Outros clubes: GD 1º Maio, Académica e V. Guimarães. Internacionalizações: 12.




Equipa 1973/1974

Como sentiu Rui Rodrigues o encanto de Coimbra na hora da despedida da sua Académica! Era o velho amor, aquele que o terá inibido de mais cedo voar por outros horizontes nas asas da águia. Atrasado chegou ao Benfica, já com 28 anos, internacional feito, jogador maduro. Agridoce, assim foi a estada de Rui Rodrigues no clube. Um portento de técnica, um martírio de lesões.

Garantiu a entrada directa para o top mais da equipa-maravilha de Hagan. Na estreia, no anfiteatro das Antas, a 12 de Setembro de 1971, aquando da primeira ronda do Campeonato, um ciclone vermelho varreu a casa azul, com Eusébio (2) e Artur Jorge a darem maior expressão ao ribombar benfiquista.

Ao lado de Humberto Coelho, na zona central da defensiva, Rui Rodrigues cedo começou a ser reverenciado. Era um virtuoso, com pés astutos e matemáticos. A tarefa jamais terminava quando subtraia a bola aos adversários. Apropriava-lhes, subtilmente, qualquer dose de ambição. Era desmancha-prazeres no momento do desarme, logo virava fazedor de sonhos no inicio da construção do edifício ofensivo. Quem não recorda aquele golo que apontou ao Sporting, em Alvalade, na confortável vitória (3-0) do Benfica? Um golo de costa a costa. Impagável.

Em três temporadas, na Luz, venceu dois Campeonatos. Só não fez o pleno, porque o triunfo, por 5-3, no covil do leão, acabou por não ser suficiente para desalojar da liderança um Sporting menos exuberante, mas à época mais regular. Sopravam, então, os ventos de Abril. Começava também uma nova era no futebol. Rui Rodrigues partiu para o Vitória de Guimarães e para a sua farmácia, que os proventos da bola não davam para facilitar. Ainda regressou ao clube, semiprofissional de facto, muitos anos depois, pela mão de Artur Jorge, responsável de todo o aparelho técnico. Treinou os mais pequeninos. Campeão nacional de infantis foi.

De origem moçambicana, ao nascer tal como Eusébio e Coluna na antiga Lourenço Marques, só não foi mais um africano nas fileiras do Benfica, porque afinal Rui Rodrigues se exibia com singularidade. É que há os inimitáveis e os (muitos) outros. Ele pertencia, coercivamente, à primeira categoria.

pcssousa

Grande Rui Rodrigues, grande academista mas também benfiquista! uma pessoa espectacular!

ednilson

Joaquim Santana Silva Guimarães. Lobito, Angola. 22 de Março de 1936-1989. Avançado.
Épocas no Benfica: 12 (56/68). Jogos: 163. Golos: 79. Títulos: 2 (Taça dos Campeões), 7 (Campeonato Nacional) e 3 (Taça de Portugal).
Outros clubes: Sport da Catumbela, Salgueiros e Freamunde. Internacionalizações: 5.




Equipa 1960/1961

"O Quim? É duas vezes pior que as cobras". Era o que diziam aos amigos mais chegados os pais de Joaquim Santana, um dos geniais jogadores que passaram pelo Benfica. Com fama de mau na infância, dócil se tornou na adolescência, adulto exemplar e não menos esclarecido seria pela vida fora.

Nasceu no Lobito, na então província ultramarina de Angola, em Março de 1936. Iniciou-se como federado no Sport Clube de Catumbela, com fama de individualista e alcunha de Molengão. Era daqueles que queriam a bola só para si, fazendo ouvidos não poucas vezes moucos a quem pedia um passe, um centro.

Já no Benfica, para onde foi transferido, no defeso de 54/55, outro remédio não teve senão corrigir alguns egoísmos, mas concomitantemente aprimorou as suas melhores faculdades. Fez duas temporadas nos escalões jovens, aspirantes e juniores, marcando à média de quase um golo por desafio.

Na equipa principal, Santana estreou-se a 21 de  Outubro de 1956, na vitória, por 1-0, sobre o Caldas. Mas quase entrou em sabatina, devido à qualidade e quantidade do elenco vermelho. Sem se trigar, prosseguiu a fase de aprendizagem, com algumas aparições esporádicas na equipa de honra. No termo de 58/59, finalmente, conquistou o estatuto de titular. As exibições na Taça de Portugal, com a eliminação do Belenenses e do Sporting, bem como a derradeira vitória, frente ao FC Porto, protagonizando uma exibição de arregalar os olhos, permitiram descobrir o verdadeiro Santana. O jogador inteligente, mais incisivo e não menos inventivo.



No inicio da década de 60, revelou-se fundamental na conquista da primeira Taça dos Campeões Europeus. No ano seguinte, já não jogou a final, porque havia... Eusébio, mas participou na campanha e teve direito à faixa. Na Taça Intercontinental, frente ao Santos, marcou os dois golos do Benfica, na derrota tangencial. Só que no jogo da segunda mão, Pele esteve diabólico e nem outro golo de Santana e um de Eusébio seriam suficientes.

A partir de 63/64, experimentou grandes dificuldades para continuar a impor-se. O quarteto José Augusto, Torres, Eusébio e Simões mostrava-se intocável. Só por essa razão um futebolista da sua qualidade poderia ser relegado para plano secundário. Era o tempo do dream team benfiquista. Mesmo assim, deixa um registo de 225 jogos e 93 golos. Com o triunfo em sete Campeonatos, três Taças de Portugal e duas dos Campeões. Pela Selecção, esteve presente em cinco desafios.

Foi uma das relíquias africanas do Benfica. Encantou a exigente association encarnada. Joaquim Santana ou o futebolista que não deveria ter sido contemporâneo de Eusébio.

Mestre

Muito me fala o meu pai de Santana. Um grande jogador e grande homem, que aceitou ser relegado para 2º plano por causa de Eusébio mas nunca deixou de dar tudo pelo Benfica.

ednilson

#194
Hans Jurgen Stefan Schwarz. Malmoe, Suécia. 18 de Abril de 1969. Defesa.
Épocas no Benfica: 4 (90/94). Jogos: 111. Golos: 10. Títulos: 2 (Campeonato Nacional) e 1 (Taça de Portugal).
Outros clubes: Malmoe, Arsenal, Fiorentina, Valência e Sunderland.
Internacionalizações: Suécia.




Equipa 1991/1992

Apesar da ausência do seleccionado nacional no Itália 90, os adeptos benfiquistas acompanharam entusiasticamente a prova. O fito era ver os desempenhos dos brasileiros Aldair, Ricardo e Valdo, bem como dos suecos Jonas Thern e Magnusson, quinteto que na Luz arraiais havia assentado. Em todo o caso, existia um motivo adicional de interesse. É que um jovem, de 21 anos, de nome Stefan Schwarz, lateral-esquerdo de posição, jogador do Malmoe, poderia estar na agenda das preocupações encarnadas. Era voz corrente em terras transalpinas, a imprensa não tardou a dar eco, Eriksson aparecia como o mentor da empreitada.

Após ter feito um Mundial positivo, Schwarz chegou à Luz, pouco tempo antes do arranque da época 90/91. Começou a titular, ainda que para o seu posto tivesse a concorrência do experiente capitão Veloso e do aguerrido Fernando Mendes. Uma lesão comprometedora afastou-o durante meses das lides, circunstância que não o impediu de garantir a faixa de campeão nacional.



Para os dois anos subsequentes, o clube perdeu o concurso dos internacionais brasileiros Ricardo Gomes e Valdo. Fragilizou-se, pois tratava-se de duas pedras de grande influência no colectivo. O FC Porto conquistou o bicampeonato, embora por um triz à segunda. É que o Benfica argumentava já com Mozer, Vítor Paneira, Rui Costa, Paulo Sousa, Kulkov, Paulo Futre, Izaías, João Vieira Pinto, Rui Águas, Yuran. E naturalmente Schwarz, um dos atletas mais utilizados nas duas temporadas (28+42 jogos). Saboreou a vitória na final da Taça, no Jamor, frente ao Boavista (5-2), em tarde de belo recital vermelho.



No decurso da crise do Verão de 93, o jogador sueco manteve-se imperturbável e... no clube, que via partir em litigio Paulo Sousa e Pacheco para o Sporting e Paulo Futre, a troco de grossa maquia, com destino ao Marselha. Sob o comando dedicado de Toni, Schwarz voltou a ser campeão nacional, com lugar cativo no elenco de um dos mais lembrados filmes produzidos pela equipa da Luz. A acção, essa, decorreu em Alvalade. Esmagadora a representação, titulo deu, após o cartaz dos 6-3.

Uma semana mais tarde, a 21 de Maio de 1994, vestiu pela última vez a camisola do Benfica. Arsenal e Fiorentina perfilaram-se no seu horizonte. Com o problema de lateral-esquerdo mal resolvido durante quase uma década, Schwarz esteve sempre presente no imaginário benfiquista. Está ainda, tanto quanto vale ser sinónimo de garra, de raça, imagem intocável de abnegação.