Decifrando imagens do passado

RedVC

Obrigado Manuel dos Anzóis  O0
Tenho conseguido ter encontrar material interessante e perguntando ou pesquisando ir conseguindo fazer algumas ligações.
Anda por aí muito material da nossa gloriosa história. Seria excelente que sempre que encontremos alguma coisa intrigante a possamos trazer a este tópico.
Mesmo que não encontremos respostas dará sempre gozo partilhar dúvidas e nesse caminho ir sabendo mais da história do Glorioso.

faneca_slb4ever

Obrigado RedVC.

Um prazer ler os teus posts.

RedVC

#62
-21-
O terceiro homem

Uma nova fotografia. Várias pistas:


Fonte: AFL

Esta é uma foto histórica.
A razão está expressa na legenda da fotografia retirada da AFL.
18 homens, 18 presidentes da AFL. Figuras de grande relevo, todos tiveram influência no futebol Lisboeta e Português.
Os mais antigos foram verdadeiros pioneiros do futebol Português.
De vários se poderia falar. Homens como Raúl Nunes, Pedro Del Negro, Magalhães Godinho. No entanto vou escolher dois ligados directamente ao Benfica. Duas grandes figuras. Dois presidentes do Benfica.

Manuel da Conceição Afonso.
Um dos maiores presidentes do Benfica. Manuel da Conceição Afonso foi o 14º presidente do nosso clube. Exerceu funções de 1931 a 1932, de 1936 a 1938 e em 1946. Um homem de notabílissimas capacidades. Mais e (e muito boa) informação: http://em-defesa-do-benfica.blogspot.pt/search/label/Manuel%20da%20Concei%C3%A7%C3%A3o%20Afonso

Augusto da Fonseca Júnior
(Colos, 10 de Fevereiro de 1895 — Lisboa, 2 de Janeiro de 1972)
Foi o 17º presidente do Glorioso. Exerceu funções de 1939 a 1945. Curioso, durante o periodo da II Guerra Mundial.  Antes foi também jogador do Benfica. Muita e boa informação aqui: http://em-defesa-do-benfica.blogspot.pt/search/label/Augusto%20da%20Fonseca

Mas... há um terceiro homem.
Uma figura interessantíssima e do qual durante algum tempo procurei fotografias alternativas. Um homem ligado ao Benfica e ao Belenenses:

Engenheiro Francisco Reis Gonçalves.

Já alguém associou este nome ao Benfica?

Foi alguém que esteve no sítio certo à hora certa.

Alguém que estava numa farmácia no dia 28 de Fevereiro de 1904.

Sim, Francisco Reis Gonçalves foi um dos 24 fundadores do Sport Lisboa.

Não sei ao certo se nasceu em Belém mas seguramente teve uma ligação forte a esse local.

Em 1919, foi um dos homens que cedo adoptou o sonho de Artur José Pereira, de quem era amigo como aqui se vê:

Fonte: "História do Sport Lisboa e Benfica: 1904-1954" Mário de Fernando de Oliveira e Carlos Rebelo da Silva


Atendendo às suas capacidades pessoais foi nomeado presidente da Junta Directiva aquando da fundação do CFB, nesse tumultuoso ano de 1919.

Seria depois presidente da Direcção de 1920 a 1922. A ele sucederia Luis Vieira, outra saudosa glória do Sport Lisboa e Benfica. Aqui: http://www.osbelenenses.com/home/clube/lista-de-presidentes/

Há ainda um outro homem que esteve ligado ao SLB e ao CFB, Virgílio Paula que foi igualmente presidente da AFL. Virgílio Paula não está no entanto na fotografia dos presidentes. Médico de profissão, foi nosso jogador e esteve igualmente na fundação do CFB. Ele e Reis Gonçalves eram os cérebros que deram corpo à primeira ideia, carregada de paixão bairrista de Artur José Pereira. Infelizmente penso que à data da fotografia Virgílio Paula já era falecido. No Belenenses Francisco e Virgílio fizeram parte de uma elite dirigente e que manteve ligações algo privilegiadas ao antigo regime:



Américo Tomás era aliás sócio do CFB e note-se o estádio desse clube chegou a ser o Estádio Almirante Américo Thomaz:



Pois é. Outros tempos...


Dandy






   Parabéns pelo teu trabalho de pesquisa.

   É um prazer ler e aprender.

   Obrigado, Red.




faneca_slb4ever


pcssousa

Verdade, o RedVC tem feito um trabalho extraordinário, de grande valor e mérito.

flavioslb


RedVC

#67
A todos, muito obrigado pelas vossas palavras.

Este é um tópico complementar a outros que existem tais como o "Recortes", o "Outros tempos", o "Retalhos da vida de um Gigante" e vários outros. Todos têm uma natureza distinta mas tem como ponto comum divulgarem informação que não é fácil encontrar. Informação que é de enorme interesse para qualquer Benfiquista. Neste tópico a ideia é partir de uma fotografia e ir decifrando, juntando pontas de forma a revelar mais sobre figuras e factos do Glorioso.

A prioridade de qualquer Benfiquista é ganhar. Ganhar no presente e contribuir individualmente para um futuro colectivo ainda mais ganhador. Com a nossa quota, com o nosso apoio, com a justa medida das possibilidades do nosso esforço. Mas eu acredito que é importante ter um entendimento mais profundo do Benfica. É preciso olhar para trás para entender. Como poder explicar a nossa actual grandeza se não conhecermos o nosso passado glorioso? Falei no Belenenses mas pode-se falar de outros clubes que tinham a nossa dimensão e que não conheceram igual crescimento. Nascemos pobres e vivemos com a casa atrás das costas. Fomos escorraçados das Salésias, da Feiteira, de Sete Rios, das Amoreiras. Clube do antigo regime? Uma ova. Andamos 50 anos a gastar o que os outros puderam investir no futebol. Éramos pobres mas competentes. Éramos pobres mas solidários. Nem todos os Benfiquistas sabem que no princípio o Sport Lisboa comprou 12 camisolas que tinham de dar para 3-4 categorias por vezes no mesmo dia. Nem todos sabem que se teve de pedir um empréstimo para comprar uma bola em segundos pés... Nem todos sabem que se teve de fazer uma subscrição para salvar o clube. Muitos outros se extinguiram. De muitos ninguém mais ouviu falar. Como pudemos  sobreviver e crescer até este ponto? Como explicar o percurso desde um terreno para treinos de cavalaria até ao gigante de aço e betão onde hoje orgulhosamente vemos as camisolas berrantes a ganhar?

A explicação só pode estar relacionada com um passado glorioso. Com factos e figuras ilustres que rechearam o nosso passado. O Benfica é a comunhão. Que outro clube têm isso inscrito no seu emblema? De todos um.

Há hoje possibilidades tremendas de comunicação. A net é um recurso espantoso e há material intrigante por aí. Por isso na partilha e na troca de ideias teremos mais e melhor conhecimento. Teremos ainda mais orgulho no nosso clube. Por isso a ideia é não ignorar quando encontramos uma fotografia que não saibamos o que é. Este espaço - proponho eu - pode ser um dos locais no SB para trocarmos material e ideias. Temos também outros tópicos vocacionados para recortes, para histórias escritas e para vídeos. Tudo na mesma lógica. A partilha de experiências e conhecimento em prol do Glorioso.


RedVC

#68
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Os primeiros troféus (parte I): o Restaurante Bacalhau..

Restaurante Bacalhau, Ruas das Fontaínhas, às portas de Benfica.


Fotografia de Eduardo Portugal. Fonte: AML.

31 de Julho de 1910. Um conjunto de 44 homens convivem à volta de seis troféus:

Fotografia de J.A. Correia, "Photografia Ideal", Benfica.

Os motivos estão aqui descritos:



As circunstâncias foram também já excelentemente descritas por Alberto Miguéns:
http://em-defesa-do-benfica.blogspot.pt/2013/07/museu-longa-marcha-dos-benfiquistas.html

Tratou-se de uma celebração das primeiras vitórias do Sport Lisboa e Benfica. Pouco tempo antes o clube tinha quebrado a hegemonia dos Ingleses do Carcavellos Football Club. Em Fevereiro o nosso Clube tinha festejado seis anos de idade. Estavamos agora dois anos após a grande fusão (mais tarde viria a dos Desportos de Benfica) que re-centrou as actividades do nosso clube de Belém para Benfica.

Infelizmente, dois desses troféus, os bronzes com figuras de atletas, desapareceram e não constam hoje do espólio do nosso museu. Segundo se diz por terem sido colocados no prego numa situação de maior aperto no clube. Nunca mais apareceram.

Com estas vitórias e com esta celebração iniciava-se assim a saga cujo mais recente episódio foi a nossa ida ao Marquês no passado mês de Maio. Ora, nesse ano de 1910 ainda a águia não tinha ninho certo, ainda o país estava em suspenso de transformações que viriam enfim no dia 5 de Outubro de 1910. Ainda e sempre lutávamos pela sobrevivência mas já éramos vencedores e formávamos novos vencedores. À volta da mesa juntavam-se dirigentes e jogadores do Benfica numa almoçarada em que se convidaram também figuras externas ao clube, entre os quais Carlos Villar, jogador e dirigente do CIF, um dos grandes pioneiros do futebol Português e também Duarte Rodrigues, director do periódico "Tiro e Sport". No final do repasto o fotógrafo J. A. Correia tirou fotografias aos convivas das quais conhecemos esta. Para mim esta fotografia ilustra mesmo a ideia "De todos, um".

É uma fotografia célebre e por isso mereceu justamente a honra de estar à entrada do nosso Museu. É magnífica.



Olhem para aquelas caras. São rostos de gente de fibra. Gente que iniciou uma aventura, um projecto imenso, já centenário.

A fotografia é também um desafio de identificação dos homens nela imortalizados. Desafio esse em que sou capaz apenas de fazer algumas identificações. Será que alguém tem dados que possam ajudar a fazer mais algumas? Seria excelente. Enquanto isso não acontece aqui vão as minhas propostas:




1 - António da Silva Marques (?), jogador
2 –
3 -  Duarte Rodrigues, Jornalista Director técnico do jornal Tiro e Sport
4 – Carlos Villar (?), dirigente CIF
5 – António Nunes de Almeida Guimarães, dirigente, Secretário da Direcção, presidente eleito em 26 de Março de 1911 sucedendo a João José Pires
6 -
7 –
8 -  Alberto Rio, jogador
9 - Germano de Vasconcelos Júnior, jogador
10 – António Bernardino Costa, jogador
11 – Félix Bermudes, jogador, dirigente
12 – Cosme Damião, jogador, capitão-geral, dirigente, fundador
13 – António Augusto Marques, jogador
14 – António Meireles, jogador
15 – Luís Vieira, jogador
16 – Artur José Pereira, jogador
17 – Francisco Pereira, jogador
18 –
19 –
20 – Carlos França, jogador, fundador
21 –
22 -
23 –
24 – Carlos Homem de Figueiredo, jogador e jornalista
25 – Eduardo Corga, jogador, fundador
26 -
27 -
28 – David da Fonseca, jogador
29 – João Carvalho Persónio, jogador
30 - João Carlos Mascarenhas de Melo, dirigente
31 -
32 –
33 -
34 -
35 -
36 –
37 – Álvaro Gaspar, jogador
38 -
39 -
40 -
41 -
42 -
43 -
44 -


Na primeira fila estão predominantemente dirigentes, na segunda e terceira uma maioria de jogadores e na terceira provavelmente predominam outros sócios.

104 anos depois. E hoje? Uma vez mais tudo muda, só o Benfica é eterno. Ora vejam:



faneca_slb4ever


SLB É O REI DO MUNDO


RedVC

#71
Obrigado pelas vossas palavras simpáticas O0

Aqui vai mais uma:

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Um Ilustre nos primórdios do futebol sadino.

Equipa do Setubalense Sporting Club:

Fonte: http://setubaldoutrostempos.blogs.sapo.pt/2008/10/
Fonte original: revista Os Sports Ilustrados de 10 de Setembro de 1910


Setubalense Sporting Club, o precursor do Vitória Futebol Clube, popularmente conhecido por Vitória de Setúbal. Mas acerca dos primórdios do futebol setubalense podemos encontrar uma fonte com bastantes detalhes aqui:

Assim começou o Vitória Futebol Clube

Era o ano de 1910, entre Agosto e Setembro, quando D. Bernardo Mesquitela – de estirpe fidalga e de tradição elegante da corte – ilustre Comandante da canhoeira "Zaire", ancorada no Porto de Setúbal, e que tinha o gosto de promover festas elegantes e desportivas, que muita animavam o Parque da Saboaria e as salas do Palacete de Quintela da Saboaria, onde habitava.
Entre as muitas figuras que frequentavam essas festas do Comandante Quintela, destacavam-se o Capitão do Porto de Setúbal, José Maria Martins Pereira; o Director da Alfândega, Narciso David e ainda o Primeiro-Tenente da "Zaire", António Henriques.
Destes convívios foi criado o Setubalense Sporting Clube, onde António Carlos Botelho Moniz, José Pombo Ahrens, dr. Silveira (oficial médico da Marinha), Joaquim da Costa Novais, entre outros, fizeram parte da primeira comissão de honra executiva.
Entre os inúmeros festivais organizados pelo novel clube – que mereceram grandes elogios nos jornais de Lisboa – destacam-se os terrestres, como por exemplo: corridas de Atletismo, Estafetas, Ciclismo e ainda um jogo de Futebol – o primeiro realizado na cidade de Setúbal – onde uma das equipas trajava camisolas listadas de "verde-branco".
Em 20 de Novembro de 1910 existiam três clubes em Setúbal: o Setubalense Sporting Clube, o Sport Clube Académico e o Bonfim Futebol Clube.
Entretanto dois jogadores do Bonfim Futebol Clube, Joaquim Venâncio e Henrique Santos, deixaram o clube e formaram o Sport Vitória, clube que aglutinou "dissidentes" dos outros clubes.
Em 5 de Maio de 1911 o jornalista Joaquim Correia propôs, na primeira Assembleia Geral, que o clube passasse a ter o nome de VITÓRIA FUTEBOL CLUBE.
A primeira Direcção do Clube foi composta por, Manuel dos Santos Barreira, João Diniz, Mário Ascensão Ledo e Joaquim Venâncio.
Em 15 de Maio desse ano o Vitória Futebol Clube disputaria o primeiro jogo da sua existência. O adversário foi o Futebol Grupo Nacional que venceram o estreante competidor por sete bolas a zero.
Em 21 de Junho de 1912 o Vitória estreia as suas camisolas verde-brancas. Na estreia venceu o Lisboa Futebol Clube por uma bola sem resposta.
No ano seguinte o Vitória Futebol Clube adquire casa própria para receber os seus adversários. Procedeu-se à inauguração do Campo dos Arcos, com um jogo com um gigante do futebol português – o Sport Lisboa e Benfica.

Fonte: http://www.viiiexercito.com/site/index.php?option=com_content&view=article&id=240:historiavfcsetubalsense&catid=1:latest-news



Já temos aqui uma primeira menção relativa ao nosso clube e acerca de uma modesta mas significativa contribuição que deu para a implantação do futebol em terras Setubalenses. Mas existe uma outra, menos evidente. Para isso voltemos ao Setubalense Sporting Clube.

Voltemos atrás, ao dia 10 de Setembro de 1910, em que o periódico Sports Ilustrados reporta um jogo entre o Setubalense Sporting Club e o Sport Club Império.

O Império era um clube com alguma notoriedade no futebol Lisboeta até 1928, data em que foi extinto, sendo nessa altura capitaneado por Travassos Lopes. Segundo a crónica o encontro terá tido uma assistência de cerca de duas mil pessoas. Uma outra curiosidade lateral das notas desse jogo é a indicação de que no grupo do Império alinharam António Bentes e Jayme Cadete, dois futebolistas que depois seriam atletas do SCP e (no caso do último) do Sport Lisboa e Benfica. O jogo terminaria com a vitória do Império por 2-1.

Mas esse não é o aspecto interessante na notícia. O aspecto que para nós é verdadeiramente interessante prende-se com uma pista que nos remete uma vez mais para Belém. Sempre Belém, sempre o Sport Lisboa.

Para estabelecer essa pista, notemos a composição da equipa do SSC. Notemos que entre os 11 jogadores se encontrava um tal de Jorge Augusto Sousa:


Fonte: Sports Ilustrados

É... é o mesmo Jorge Sousa listado entre os fundadores do  Sport Lisboa. Mais um dos 24 homens que dia 28 de Fevereiro de 1904 se reuniram na Farmácia Franco para fundar o Sport Lisboa. Apressadamente que havia que ir treinar... Mais um dos companheiros de Cosme Damião e de Francisco Reis, de quem já aqui se falou.

Jorge de Sousa, pela disposição da equipa na fotografia era provavelmente o médio direito daquela equipa. Para além disso assumia uma outra função, a de tesoureiro desse novo clube, o que explica o seu destaque no medalhão à direita. O outro medalhão refere-se a Aureliano Soares Leite, presidente da Direcção nessa altura. Mais tarde, Jorge de Sousa viria a ser o segundo presidente eleito do Vitória Futebol Clube.



Jorge de Sousa nasceu em Almada em 1881. Em Setúbal evidenciou-se como organizador de actividades na área da educação física, especialmente nas referentes ao desporto. Em 1909 formou um grupo de amigos do futebol. Quando em 1911 se fundou o clube Vitória foi ele o seu principal animador. O jornal O Sport de Lisboa referia-se-lhe em 10 de Outubro de 1920 como "saudoso desportista" Fonte: http://mcquintas.paginas.sapo.pt/index11.html.

Terá pois morrido ainda antes de 1920 mas ainda hoje tem uma Rua com o seu nome em Setúbal.

Jorge Sousa pertencia ao grupo de antigos casapianos que juntamente com o grupo dos Catataus fundou o Sport Lisboa. Foi assim mais um dos antigos casapianos cujo dinamismo e cultura desportiva produziram tantos e tão benéficos efeitos em tantos locais de Portugal. Nesse tempo a cultura desportiva era incipiente e a acção destes pioneiros nos locais para onde a sua profissão os levou, contribuiu grandemente para a revolução de mentalidades e para as fundações de uma outra perspectiva de vida e de associativismo desportivo. Entre esses nomes incluem-se José Joaquim Mira e Carlos Homem de Figueiredo também em Setúbal, Leopoldo Mocho em Portalegre, José Domingos Fernandes, Raúl Vieira Joaquim dos Santos Pimenta  em Coimbra, Constantino da Encarnação em Braga e Viana do Castelo, António Maria de Oliveira e Artur Pereira no Barreiro e por aí adiante. A lista é longa e notável podendo ser encontrados mais detalhes aqui: http://www.casapia-ac.pt/pioneirismo.pdf.

Para que conste e para que o seu nome seja lembrado. Por Benfiquistas e por Sadinos.


RedVC

#72
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Os Condes do Restelo

Junho 1907, Paços Concelho, Lisboa
Fotografia de Joshua Benoliel.


Á esquerda esboço de Ignacio José Franco - Conde do Restello em 1903 - Fontes: Tiro Civil 255. e AML

Na fotografia estão retratados os homens que constituiam o elenco que dirigia a Camara Municipal de Lisboa. Presidido por Teodoro Ferreira Pinto Basto (barbas brancas), esse elenco tinha como um dos vereadores um nome ligado ao Sport Lisboa e Benfica: Inácio José Franco.

Inácio foi o 2º Conde do Restelo depois da morte de seu pai Pedro Augusto Franco, se não estou em erro ocorrida em 1903.

Era proprietário da Farmácia Franco juntamente com o seu irmão igualmente chamado Pedro Augusto Franco.

Por ser diplomado em Farmácia Pedro Augusto Franco substituiu o seu pai na Direção da Farmácia. Foi juntamente com o Dr. António de Azevedo Meireles, sócio benemérito do Sport Lisboa.

Os dois irmãos Franco viam com bonomia a actividade daquele grupo de jovens entusiastas do futebol que no pátio da Farmácia e depois nos areais de Belém, nas Terras do Desembargador e nas Salésias davam pleno curso à sua paixão pela prática do futebol.



Localizei também uma fotografia do pai de ambos,  o 1º conde do Restelo, Pedro Augusto Franco (1833-1903):


Como se vê o 1º conde do Restelo foi o 3º administrador ou presidente da Caixa Geral de Depósitos, cargo que assumiu pela primeira vez no início de 1881.

Dandy


RedVC

#74
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Resistência: sugestão e mistério

Nota prévia: este texto foi de construção um pouco ingrata. Há muito ainda por descobrir e em alguns pontos o texto é mais interpretativo podendo ter algum elemento menos correcto. Serão bem vidas contribuições que possam adicionar detalhes ou corrigir eventuais erros.

1907, equipa de futebol do Grupo Sport Benfica.



Esta fotografia consta da História do SLB (1904 – 1954) de Mário de Oliveira e Rebelo da Silva. A sua legenda identifica 10 dos 11 jogadores. Da esquerda para a direita:
1ª fila – guarda redes e defesas: João Carvalho Persónio, Custódio Xavier, Luís Vieira;
2ª fila - médios: António Marques, Cosme Damião, Dias da Silva;
3ª fila - avançados: Robert Matos, António Vieira, NN, Mário Costa e Marcolino Bragança.

Qual a sua importância?

Em primeiro lugar a sua raridade. É a única que conheço de uma equipa de futebol do Grupo Sport Benfica. É também importante porque se reporta a meados de 1907, um período de resistência, crítico para o nosso clube. Esta fotografia integra alguns homens chave nesse processo.

Em 1907, o Grupo Sport Benfica, por vezes também designado Sport Clube Benfica, era conhecido por a maioria dos seus sócios serem empregados do comércio que nos seus dias de descanso faziam excursões ou festas desportivas (ver Tiro e Sport nº 360, 15 Agosto 1907). Era um clube ecléctico embora privilegiando o ciclismo e atletismo como modalidades desportivas primordiais. Não era por acaso que o seu emblema ostentava uma roda de bicicleta, pormenor que ainda hoje subsiste.



As suas equipas de futebol eram fracas e pouco competitivas. Em contraste, o clube tinha arrendado à época um excelente campo de jogo, a Quinta da Feiteira.

Mas esta formação de 1907 já era uma equipa reforçada ao integrar pelo menos quatro jogadores vindos do Sport Lisboa: Persónio, Luís Viera, Cosme e Marcolino. Tinha também outros elementos que desconheço se ainda jogaram pelo Sport Lisboa mas que sei seguramente terem jogado por outros clubes: Robert de Matos (Cruz Negra) e Dias da Silva (CIF). Ao integrarem a equipa do Grupo de Sport Benfica, esses 4 jogadores do Sport Lisboa procuravam continuar a sua actividade futebolística e ao mesmo tempo - presumo eu - manter uma reflexão colectiva para decidir o futuro.

O Sport Lisboa vivia assim num limbo, numa indefinição total quanto ao seu futuro. Era um clube que rapidamente tinha conquistado grande adesão popular apesar de ter sido fundado apenas três anos antes. Estava agora à beira do precipício pois quase todo o seu núcleo duro competitivo tinha desertado, rendido às dificuldades e atraído pelos chás dançantes. Os que ficaram devem ter sentido que aquelas gloriosas camisolas vermelhas mereciam continuar a exibir-se orgulhosamente, vencendo nos campos Lisboetas.

Mas as dificuldades eram enormes. Sem campo, sem dinheiro, sem primeira categoria e com a desmotivação de ver alguns fundadores a desertarem. A agravar isso, a deserção dos 8 jogadores da primeira categoria para o SCP sinalizou também o caminho para outros. E de facto vários desiludidos optaram por procurar outro clube. Apenas um pequeno grupo decidiu resistir.

O que iria na mente de Cosme, Gourlade, Bermudes e seus pares? Aceitar a extinção do Sport Lisboa e procurar o futuro noutro clube ou pelo contrário resistir?

Não terá sido imediato mas finalmente decidiram resistir e com o seu entusiamo iniciaram um processo activo que contagiou muitos dos que tinham partido. E assim, gradualmente, entre 1907 e o ano seguinte, muitos viriam a regressar.

Mas quem foram esses resistentes? Quem integrou esse núcleo duro de vontade indómita, de crença persistente e que liderou esse processo?

Recentemente um grande Benfiquista com muito mais capacidade e informação do que eu tenho caracterizou-me a resistência de uma forma muito interessante e que me agradou. Esse núcleo duro pode ser estruturado numa 1.ª linha de resistência: Marcolino Bragança (ideia), Cosme Damião (organização) e Félix Bermudes (financiamento adiantado).

Ora nesta fotografia desses três apenas Bermudes não está presente.

De Cosme não vou falar pois felizmente tem-se falado muito e quase sempre bem.

Félix Bermudes apesar de ainda jogar já tinha outras responsabilidades, fruto da sua capacidade financeira e do seu meio social. Félix foi um dos homens que pelo lado do Sport Lisboa lideraram as negociações que levaram à fusão de Setembro de 1908. Evidenciava também uma visão colectiva e ecléctica do clube, não se coibindo de alinhar pelas categorias secundárias – se esse facto fosse benéfico quer do ponto de vista competitivo quer do ponto de vista motivacional para os mais jovens – como também de praticar muitas outras modalidades desportivas: tiro, hipismo, esgrima, atletismo.

De Marcolino de Bragança, fica a ideia de um meteoro pois a sua passagem pelo clube foi fugaz mas brilhante uma vez que cedo regressaria a África. Marcolino deu a ideia sobre a qual tudo assentou. A ideia simples e lúcida de passar a segunda para primeira categoria. Com essa transição a competitividade foi assegurada pois essa equipa era fortíssima. Cosme apelidou-o de "jogador esplêndido" e nesta fotografia ele aparece-nos como extremo esquerdo mas terá jogado também como médio esquerdo.

A este núcleo eu acrescentaria Manuel Gourlade, a primeira águia. O homem que foi o principal motor da junção do grupo dos Catataus com os Casapianos, foi apenas um jogador modesto com actividade regular nas categorias inferiores se não estou em erro entre 1904-1905. Mas em 1907 a acção dinâmica de Gourlade continuaria a ser fundamental para a sobrevivência. Gourlade levou a cabo uma subscrição popular bem-sucedida, que terá tendido 27 mil Réis, tendo ele próprio doado muita das suas economias. Outros beneméritos foram o Conde do Restelo e o Dr. António Azevedo Meireles cujo prestígio e suporte monetário deu significativa contribuição para o processo.

Mas existiram outros elementos que numa 2.ª linha de resistência viriam a ter contribuições igualmente importantes. Sabemos de alguns tais como: Virgílio Paula (tesoureiro-secretário) e Luís Kruss Gomes (ambos originários do Restelo FC), Silvestre Silva e Daniel Santos Brito (fundador e colega de Gourlade).

Por exemplo Silvestre da Silva, antigo jogador e prestigiado casapiano (chegou a vice-director) terá sido o autor do primeiro golo de um jogo do Sport Lisboa reportado pelos jornais. Em 1907, Silvestre já não jogava mas coube-lhe concretizar a inscrição para que o Sport Lisboa disputasse o campeonato de 1907-1908. Uma formalidade burocrática mas de enorme significado para a sobrevivência do Sport Lisboa, garantindo a continuidade da sua actividade desportiva e competitiva.

Mas, esta fotografia dá pistas para adicionar pelo menos mais dois resistentes à lista: João Carvalho Persónio e Luís Vieira. A estes homens o Sport Lisboa e Benfica deve também um reconhecimento especial.

Persónio foi um antigo casapiano, que jogando a avançado integrou as equipas que desafiaram os mestres Ingleses do Cabo Submarino. Embora sem certezas, presumo que Persónio ainda terá jogado nos campos do Campo-Pequeno. No Sport Lisboa foi guarda-redes apesar de ter uma estatura não muito compatível com o lugar. Teve também uma acção importante na evolução desportiva do clube após a fusão.

Luís Vieira é um outro caso, por sinal curiosíssimo. Filho de Belém, jogador do tempo das Salésias, integrou as equipas das categorias inferiores do Sport Lisboa. Assumiu muitos lugares em campo mas foi no lugar de avançado que se fixou. Foi igualmente um dos primeiros jogadores – talvez o segundo – a jogar no estrangeiro. De facto, após a digressão de Julho-Agosto de 1913 de uma equipa da AFL ao Brasil (Rio de Janeiro e São Paulo), Vieira decidiu ficar no Brasil. Jogou no Botafogo do Rio de Janeiro onde não sendo estrela foi no entanto destaque. Marcou golos. Regressou em 1916, voltando a jogar pelo seu Benfica. Alberto Miguéns fala disto e muito mais, aqui: http://em-defesa-do-benfica.blogspot.pt/2014/08/francisco-luiz-e-rogerio.html. Luís Vieira no entanto viria a ser mais um dos homens que na turbulência da crise Belém-Benfica de 1919, veio a ingressar no recém-formado Clube de Futebol "os Belenenses". Já não jogava mas foi importante, tendo aliás em 1920 chegado a presidente, substituindo o Engº Reis Gonçalves, um dos fundadores do...Sport Lisboa. Estes factos expõem a clivagem que os filhos de Belém provocaram, desencantados com a evolução do SLB e principalmente com a deslocalização do clube de Belém para Benfica.

Mas voltando à resistência de 1907, fica claro que acção de Cosme e deste núcleo duro evitou a extinção do Sport Lisboa. A evolução fez com que dois clubes prosseguissem a sua actividade juntando forças.

E dessa forma durante a época de 1907-1908 as camisolas vermelhas continuaram em campo. Aliás, durante essa época o clube continuou a chamar-se Sport Lisboa. Ganhou-se oxigénio, esperança e convicção de que o caminho passava por manter e vitalizar o clube. E a oportunidade surgiu com os contactos entre Cosme, Bermudes e os líderes do Grupo Sport Benfica. Mas essa é outra história.

Em jeito de homenagem aqui fica uma imagem composta com estes Benfiquistas de boa cepa:



Por último a fotografia desafia-nos também com uma questão intrigante: de que cor seriam as listas da camisola do Grupo Sport Benfica? Seriam pretas, azuis, vermelhas ou verdes? Talvez isso esteja nos estatutos do clube. Gostaria de saber. Alguém sabe?